Dezembro é o mês mais violento para os animais. O mês em que é celebrado o Natal, o espírito natalino, um tempo de paz, é marcado por muita violência. É em dezembro que a demanda por carne é muito superior à de qualquer outro mês. Há muitas encomendas, de animais inteiros, com olhos, com boca, decapitados, eviscerados, fatiados, etc, conforme o gosto e a (in)sensibilidade do freguês.
É costume muitas pessoas encherem os carrinhos de carne nesta época do ano – e os animais escolhidos variam conforme predileção e condição financeira. Compram quilos e mais quilos de aves, suínos, bovinos, ovinos, caprinos e peixes, preparados das mais diferentes maneiras. Em muitas casas, é possível juntar pedaços de animais e fazer um presépio. “É preciso oferecer uma mesa farta”, dizem apontando para as carnes, que nada mais são do que partes fatiadas ou inteiras, e normalmente assadas, de espécies mortas (você pode preferir abatidas) para a celebração do nascimento de Jesus.
Segundo a tradição cristã, quando Jesus nasceu, os animais estavam bem próximos à manjedoura, e o calor de seus corpos o aqueceu. Atualmente, no Natal, são as pessoas que aquecem os corpos desses animais, mas nas brasas da churrasqueira, no forno, na grelha. Com a chegada do Natal, mais bebês, pais e mães de outras espécies serão servidos sobre uma mesa.
Antes há muitos abraços. As pessoas desejam o melhor umas às outras, menos aos animais, que devem continuar cumprindo o seu papel enquanto comida, e sendo rejeitados como seres sencientes e conscientes. Às vezes, com sorte, pode ser que dividam o mesmo espaço sobre a mesa. Claro, não na mesma forma ou travessa, mas talvez nas imediações, pedaços sem vida combinando a poucos centímetros. Seria uma baita coincidência, não? Talvez um gesto inconsciente de bonomia? Difícil dizer.
No Natal, o espírito de solidariedade e fraternidade emerge como nunca. Sorrisos, lembranças e olhares que miram grandes pedaços de carne, mas que recusam-se a racionalizar que cada fragmento já foi parte de uma vida; da vida de uma criatura que até o seu último momento não desejou morrer precocemente, assim como qualquer outro animal senciente, humano ou não.
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