Categorias: Opinião

O mau cheiro vem do porco ou da exploração do porco?

Foto: Unsplash

Passando perto de uma área onde criam porcos, alguém me disse que o problema era o mau cheiro de porco. Então fiz uma pergunta: “Mas esse é o cheiro do porco ou o cheiro imposto ao porco?” Quero dizer, naturalmente esse não é o cheiro do porco, mas é o cheiro do que está associado à realidade indesejada pelo porco.

Porcos teriam esse cheiro se vivessem outra realidade? Não são os interesses de exploração e consumo que possibilitam ou geram esse cheiro tão criticado como sendo de porco, mas sem que seja naturalmente do porco?

O julgamento sobre isso deveria ser baseado nas escolhas que o porco não pode fazer. Afinal, é comum, por exemplo, que quando há animais confinados em um espaço, onde seus excrementos se acumulam antes da remoção, eles são obrigados a entrarem em contato com esses dejetos, mesmo quando quem os cria afirma que mantém a constante higiene do local.

E mesmo quando o cheiro não tem relação com os dejetos, terá com a alimentação que também não é uma escolha do porco, e porque é uma escolha para, sem demora, matá-lo. Nada em relação ao que é afirmado pejorativamente sobre porcos surge pelos porcos, e sim pela intervenção humana, por interesses que são sobrepostos aos dos porcos.

Não há maior constância de imagens de animais sujos e que também podem parecer malcheirosos do que aquelas em que os animais estão sendo explorados para interesse humano, e porque isso reflete o que é mais comum, mesmo que, por costume ou irreflexão, não seja pensado dessa forma.

Então carece de sentido a afirmação do porco como animal fedido, assim como a do porco como animal sujo, e porque a sujeira do porco também só pode ser decorrente do tratamento imposto a ele, já que porcos evitam a sujeira, assim como seus ancestrais.

A ideia da generalização sobre animais explorados, e em que se ignora o fator exploração que possibilita sentidos pejorativos sobre o animal, e não o próprio animal, é algo a se refletir também porque é estranho como são usadas tantas atribuições negativas em referência a outros animais, e como se fossem inerentes a esses animais, e não à exploração.

Sem dúvida, isso não ocorreria senão pelos equívocos que se normaliza com o especismo.

David Arioch S.A. Barcelos

Jornalista (MTB: 10612/PR) e mestre em Estudos Culturais (UFMS).

Posts Recentes

Quando uma criança viu o sofrimento de um peixe

Uma criança viu pela primeira vez um peixe sendo tirado da água. Lutava com o…

23 horas ago

O animal não cabe dentro do interesse humano

Ver o interesse dos animais não significa querer ou fazer com que esse interesse prevaleça,…

2 dias ago

Se quem mata animais profissionalmente é cruel, devemos nos perguntar, é cruel em nome de quem?

Há muito tempo quem mata animais no matadouro é associado à crueldade. Encontramos exemplos em…

3 dias ago

A morte é uma libertação para o animal explorado?

Esta semana, quando um boi teve morte súbita a caminho de um matadouro no Paraná,…

5 dias ago

No século 19, Comte observou que humanos estavam tratando outros animais como “laboratórios nutritivos”

Em “A lição de sabedoria das vacas loucas”, Lévi-Strauss cita como Auguste Comte, mais conhecido…

6 dias ago

Homem que trabalhou em matadouro reconhece crueldade do abate

Conheci a história de um homem que trabalhou em um matadouro abatendo cerca de 500…

7 dias ago