Por que quando um animal criado para consumo recebe um nome é mais difícil desejá-lo morto (carne) ou matá-lo?
Não que seja sempre assim, mas dar um nome a um animal que será morto para fins alimentícios possibilita um conflito porque o nome surge como um reconhecimento do animal, de que ele é um indivíduo, e um indivíduo em relação.
No filme francês “Homens à beira de um ataque de nervos”, de Audrey Dana, há uma cena em que Hippolyte fica incomodado ao saber que um galináceo morto e que só ele deseja comer se chamava Robert. E mais, isso o deixa irritado.
O nome foi dado por quem não via no animal uma criatura a ser morta e comida, diferentemente de Hippolyte, que pergunta: “Por que você foi dar nome ao bicho?” Mais tarde, Hippolyte não come o animal e o sepulta.
Sabemos que animais criados para consumo normalmente não recebem nomes. A maioria recebe identificação baseada em números, que são reafirmações de estado de propriedade, assim como humanos também fazem com itens, objetos.
A ausência de nome também ratifica a condição do animal de não ser criado para viver, de um “breve estar”, e por não ser para viver, crê-se que prescinde de nome nessa relação que é direcionada à morte e não à vida.
A ausência de nome também facilita o distanciamento em relação ao animal, porque a nominação é baseada em uma relação em que não se pensa no seu fim, não com a brevidade do que ocorre com animais que são criados para a morte, e porque isso é mais comum quando não há um fim como objetivo.
Alguém pode dizer que nominar um animal não humano é antropomorfizá-lo, alegando que o nome não é relevante a ele, mas a nominação tem um efeito na consciência humana pela significação cultural da atribuição de nome.
Claro que se isso muda algo para um ser humano, como no incômodo de Hippolyte, é porque o nome tira a comum abstração do não pensar no animal como indivíduo, mas “só mais um meio de obtenção de carne”.
Um animal com nome é mais pensado como alguém do que um animal sem nome. Quando um animal criado para consumo tem um nome não conclui-se que tão logo tal animal já não estará aqui, diferentemente do que não tem nome, mesmo que a única diferença entre eles seja a nominação.
O filme está disponível no Prime Video.
Leia também “Por que comemos indivíduos?” e “Animais não deveriam ser reduzidos a propriedades“.
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Putz, David... sou jornalista e vegano radical há mais de 30 anos. adoraria participar do Vegazeta. seus textos são muito bons: cultos, questionadores, ousados e avançados. precisamos de coisas assim para evitar a mortandade diária dos animais.
Eduardo, muito obrigado! Fico lisonjeado.