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Um novilho escapou do matadouro, mas não sabia para onde ir

Por nunca ter experimentado a liberdade, não conseguiu ultrapassar as imediações do matadouro

Um novilho escapou de um matadouro, mas não sabendo para onde ir, já que nunca experimentou a liberdade, não conseguiu ultrapassar as imediações do matadouro. Foi fácil capturá-lo e enviá-lo de volta para morrer.

Embora não desejasse o matadouro, ele não sabia como livrar-se definitivamente do matadouro. Isso leva a uma reflexão sobre a domesticação de animais, sobre o estado de confusão do animal na ação pela liberdade.

Alguém poderia dizer que o novilho não sabia que iria morrer, porém algo sobre o matadouro motivou sua fuga. Logo o que problematizo não é ele saber ou não que seu fim era ali, mas que ele agiu motivado pelo desejo de não estar ali.

Algo sobre aquele lugar o levou a querer buscar outro lugar. Diante desse episódio, recordei-me do que Alfred Crosby relatou em “Imperialismo Ecológico” sobre os equídeos e bovídeos selvagens de tempos distantes que libertavam os domesticados.

Muitos animais foram mortos em estado de liberdade para que não interferissem no domínio sobre os que eram mantidos cativos, afastando o que seria, em capciosa percepção antropocêntrica, “uma contaminação comportamental”.

Hoje, quando um animal foge do matadouro, mas não sabe para onde ir, por nunca ter experimentado a liberdade, é também porque o animal, embora manifeste anseio que não deixa de ser expressão ancestral (o não doméstico que persiste no doméstico), não condiz com o que ele viveu. Não é algo que ele experimentou antes.

O desejo de liberdade é o desejo pelo que é sobre a vida e que pulsa dentro do animal (mesmo inatural). Se o animal não consegue escapar à captura, e que normalmente não evita seu fim no matadouro, isso também é decorrente da barreira imposta ao animal.

Não são apenas a prisão física e a morte que refletem o domínio sobre esse animal, mas também a imposição imanente ao arbitrário e efêmero viver doméstico, que é também expressão de um abstrair do animal a capacidade de reagir pela concorrente internalização da prisão.

Assim o mal do domínio humano não expressa-se somente na morte do animal e no viver do animal, mas também nos limites impostos à condição animal (em precedência). O animal antes de nascer, para fim no interesse humano, é concebido como idealização do seu não prevalecer.

Jornalista (MTB: 10612/PR) e mestre em Estudos Culturais (UFMS).

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