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Uma criança que queria salvar os animais

Na meninice, os animais se transformavam em nuvens, fugindo de tudo que poderia doer. “E sumiam, outros chegavam e também partiam.” Era o que via.

“Os animais corriam lá em cima. Quem os alcançaria tão alto no céu? Não poderiam ser feridos ou tocados. Eu dizia que era a porta do além-mundo, onde ninguém comemora a dor.”

Sentia o cheiro do verde, por onde os animais passavam com pouco de paz, tão curta que logo o chão não era tocado pelas mesmas dúzias de pés. Estes já viravam aqueles que desapareciam.

Se reclamasse, riam. Chamavam as queixas de “tolice da criancice”. Quando escondeu um pequeno para livrá-lo de miserável fim, acharam graça dos olhos embargados. “Deixe de ser bobo! Tá na hora de crescer, né?”

Ainda sentiu o pobre animal nas mãos vazias quando, de sua ausência, ouviu dois sons – um que saía da boca e outro do corpo em atrito com coisa estranha. Olhou as mãos e reconheceu que há pouco a morte era vida saudável – desvalida, interrompida.

Depois lembrou dos olhos e de como o pequeno encolhia as pernas, buscando abrigo em si mesmo e nele. “Morrem tão cedo, e eu, ainda criança, nem sabia dizer quantos foram apartados da vida desde que nasci. Cada chegada era uma partida, ou mais de uma, muito mais…”

Os animais que não deixaram salvar acumulavam em sua consciência, e começou a deitar lá fora, mirando o céu, imaginando que viravam nuvens ou se escondiam entre elas. “Não pra ficar lá pra sempre, só até desaparecer pra um lugar melhor, pro além-mundo.”

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Jornalista (MTB: 10612/PR) e mestre em Estudos Culturais (UFMS).

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