Opinião

“Carga viva”, nossa miséria refletida nos olhos dos animais

Vive o não viver e morre sem tempo de se reconhecer (Fotos: Magda Regina/Reprodução/Animals Australia)

Quando tratamos animais como “cargas vivas” e os submetemos a todos os tipos de situações em oposição ao bem-estar animal, incluindo exportação, e apenas porque gera lucro, provamos o quanto o dinheiro está acima da dignidade e da capacidade em reconhecer que vidas não deveriam valer tão pouco.

Jornada que dura pelo menos três semanas

No caso da exportação, cada animal, independente de origem, é forçado a uma jornada que dura no mínimo três semanas para morrer distante do local onde nasceu. Vive o não viver e morre sem tempo de se reconhecer.

Será que chegaram a circular “livremente” em algum momento de suas vidas sem qualquer interferência humana? Qual seria o sentimento predominante quando são empurrados para o fosso da desfaçatez e da miséria humana?

Se sucumbem a bordo, são moídos…

Se sucumbem a bordo, são moídos, se escapam de um acidente, morrem afogados ou são abatidos pouco depois de chegarem às margens. Se aportam em “segurança” são preparados para o abate sem atordoamento – golpe em forma de meia lua que faz o sangue descer enquanto se debate.

Essa é a realidade promovida por 20 países do mundo que exportam quantidades surpreendentes de animais vivos criados para consumo – milhares, dezenas de milhares e que somam milhões ao final do ano.

Violência contra a dignidade não humana

Em 2019, o presidente da Associação Brasileira de Exportadores de Animais Vivos (Abreav) disse que, com mais apoio do governo, a projeção já era de aumento de 25% na comercialização de gado vivo que parte do Brasil – crescimento que tem se concretizado.

Acredito que mais sujo do que um navio de exportação de “carga viva”, ainda que na desatenção pareça limpo, é o dinheiro que se lucra com essa violência contra a dignidade não humana.

Carne enquanto produto é um insulto moral

Se refletisse com profundidade a respeito, como você se sentiria em ser dono de uma “carga” de milhares de animais submetidos a uma vida miserável para que possa encher os bolsos de dinheiro?

Uma atividade sem real impacto social positivo, e que existe como consequência de vivermos em um mundo onde uma minoria cria dezenas de bilhões de animais por ano para alimentar “todos” aqueles que não são pobres demais para pagarem por isso. A carne enquanto produto é um insulto moral, uma direta e simbólica representação da arbitrariedade.

Atualizado em 01/01/2022

Gosta do trabalho da Vegazeta? Colabore realizando uma doação de qualquer valor clicando no botão abaixo: 

David Arioch S.A. Barcelos

Jornalista (MTB: 10612/PR) e mestre em Estudos Culturais (UFMS).

Visualizar comentários

  • Usar a bíblia como defesa dos actos bárbaros é, no mínimo, uma falácia pouco inteligente. Neste caso, a ganância e a gula também são citadas?

Posts Recentes

Quando uma criança viu o sofrimento de um peixe

Uma criança viu pela primeira vez um peixe sendo tirado da água. Lutava com o…

14 horas ago

O animal não cabe dentro do interesse humano

Ver o interesse dos animais não significa querer ou fazer com que esse interesse prevaleça,…

2 dias ago

Se quem mata animais profissionalmente é cruel, devemos nos perguntar, é cruel em nome de quem?

Há muito tempo quem mata animais no matadouro é associado à crueldade. Encontramos exemplos em…

3 dias ago

A morte é uma libertação para o animal explorado?

Esta semana, quando um boi teve morte súbita a caminho de um matadouro no Paraná,…

5 dias ago

No século 19, Comte observou que humanos estavam tratando outros animais como “laboratórios nutritivos”

Em “A lição de sabedoria das vacas loucas”, Lévi-Strauss cita como Auguste Comte, mais conhecido…

6 dias ago

Homem que trabalhou em matadouro reconhece crueldade do abate

Conheci a história de um homem que trabalhou em um matadouro abatendo cerca de 500…

7 dias ago