Categorias: Opinião

Para não ser morto, um animal deve ser útil?

Foto: Pixabay

Para que um animal não seja morto, ele deve ser útil? É sobre essa questão que reflito quando as pessoas dizem “para não matar um animal porque ele é útil”. Imagine se disséssemos que se não consideramos um humano útil, ele não deve viver.

É como dizer que o viver de um animal deve ser condicionado à sua utilidade, e a utilidade normalmente tende a ser pensada como benefício humano. Isso é muito comum quando alguém diz para não fazer mal a um animal “porque ele ajuda no controle de pragas”, por exemplo, que também traz a subjetividade da “praga”.

Por que não respeitar o interesse do animal de não ser desnecessariamente prejudicado? É preciso que exista um benefício para nós? Mesmo que uma pessoa use esse discurso por acreditar que é uma forma de “motivar as pessoas a não fazerem mal aos animais”, isso não deixa de ser uma mensagem que ratifica a crença de que o animal não deve ser considerado um fim em si mesmo.

Porque quem receberá essa mensagem pode ou não mudar de atitude, e mudando, não será pelo animal, mas pelo benefício humano que passará a compreender em relação a esse animal. “Ou seja, se ele é útil, não devo matá-lo, não devo causar-lhe mal.” Isso não deixa de dar continuidade a uma tradição de perspectiva utilitária sobre animais não humanos.

O problema é que esse pensar continua rejeitando o que em relação a esse animal não deveria ser sobre nós, porque é condicionar o permitir viver a um fazer. É o mesmo discurso persistente naquela lógica ecológica de que a importância não é o indivíduo, e sim o papel que o animal desempenha – o que desconsidera o indivíduo para o indivíduo.

Mesmo que pessoas rejeitem essa consideração, não seria no mínimo um reducionismo e perder uma oportunidade a mera difusão dessa perspectiva unilateral ou utilitária sobre os animais? Se podemos tentar fazer mais, e se não tentamos, pode haver realmente uma grande transformação e uma grande mudança relacional se outros animais continuam sendo sobre nós?

David Arioch S.A. Barcelos

Jornalista (MTB: 10612/PR) e mestre em Estudos Culturais (UFMS).

Posts Recentes

O animal não cabe dentro do interesse humano

Ver o interesse dos animais não significa querer ou fazer com que esse interesse prevaleça,…

13 horas ago

Se quem mata animais profissionalmente é cruel, devemos nos perguntar, é cruel em nome de quem?

Há muito tempo quem mata animais no matadouro é associado à crueldade. Encontramos exemplos em…

2 dias ago

A morte é uma libertação para o animal explorado?

Esta semana, quando um boi teve morte súbita a caminho de um matadouro no Paraná,…

4 dias ago

No século 19, Comte observou que humanos estavam tratando outros animais como “laboratórios nutritivos”

Em “A lição de sabedoria das vacas loucas”, Lévi-Strauss cita como Auguste Comte, mais conhecido…

5 dias ago

Homem que trabalhou em matadouro reconhece crueldade do abate

Conheci a história de um homem que trabalhou em um matadouro abatendo cerca de 500…

6 dias ago

Um humano na pele de um porco

Um dia acordou porco. Arrastaram-no para fora de casa e o enviaram para uma fazenda.…

6 dias ago