É fácil encontrar pessoas que reconhecem que os animais têm capacidade de sofrer, reagem ao ambiente e ao tratamento que recebem. Porém por que essas pessoas não veem problema na imposição de um sofrimento evitável decorrente do uso de animais?
Por que reconhecer a capacidade de sofrer, mas não ver problema em estimulá-la e intensificá-la por interesse? Não é um paradoxo? Se percebo que alguém sofre em uma situação que favoreço, não devo encontrar um meio de eliminar/evitar tal sofrimento?
Se sou causa, ainda que não total, mas parcial, partindo de uma posição de consumo, logo contributiva, não devo compreender essa realidade como de uma necessária mudança? Não seria uma reação natural? Sim e não.
Pode-se dizer que a importância e praticabilidade de evitá-lo seria uma reação natural à maioria se estivesse inserida em um contexto em que é educada para essa percepção, logo livre dos ardis da superficialização do sofrimento animal e da sua atribuição capciosa de imprescindibilidade associada à crença supremacista no exercício “autodado de autoridade”.
O que predomina então em relação ao sofrimento animal não é sua negação, ainda que muitos acreditem que animais podem morrer sem sofrer. Isso também não significa que rejeitem a capacidade de os animais experimentarem dor quando alvos de um sistema de consumo. Mas, sendo assim, por que não mudam?
Porque a compreensão do sofrimento animal é multívoca. O que causa em mim não é o que causa em outro. É fácil reconhecer o sofrimento dos animais, porém o que é esse sofrimento para cada um que admite compreendê-lo como sofrimento?
A interpretação de sua dimensão não é reproduzível em nível de equivalência. O termo “sofrimento animal” não desencadeia percepção una, homogênea. Sua concepção é diversa em associações, impactos, estímulos e desígnios, influenciados também por nossa construção social.
O anseio por evitá-lo só é percebido como urgente quando a construção em torno da ideia do “sofrimento animal” atinge-nos de maneira que compreendemos nossa recusa em favorecê-lo como irreversível ou, no mínimo, inadiável, e porque não é apenas sobre “saber”.
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