Posso olhar para um animal e descrever seu aspecto que desperta em mim reprovação de sua situação – a maneira como interpreto sua compleição, expressão, posição do corpo e que tipo de gravidade isso transmite.
No entanto, por que eu deveria focar-me no aspecto? É o aspecto que justifica meu antagonismo à realidade não humana? Sem dúvida, não posso negar que o aspecto pode influenciar e reforçar posições, mas não é o aspecto que fundamenta minha oposição, e sim a impositiva presença do animal em determinado contexto ou situação.
Se falo em situação, pode-se pensar em estado de transitoriedade, que também pode ser a ideia de uma miséria animal momentânea – o recorte da especificidade, do olhar angular. E não é também estado de transitoriedade a brevidade que é o nascer, ser submetido e morrer para atender demandas de consumo?
Não vejo equívoco em definir todas as criaturas subjugadas pelo interesse humano como indivíduos (não reconhecidos) em estado de transitoriedade, porque são criaturas em trânsito, mesmo quando mantidas em estado estacionário – já que suas presenças, idas e vindas, são perpetuadas por violações e violências circulares.
Podemos preocupar-nos com a sede de um animal a caminho da morte, com sua dificuldade em lidar com altas temperaturas, com seus olhos baixos e difusos, porém se nossa contraposição limita-se a essa situação, nossa atenção volta-se ao “aspecto”. E, então, para qual estado de transitoriedade estamos olhando?
Não para o estado de transitoriedade que resulta em outros estados de transitoriedade, sendo o primeiro substancial e os demais seus consequenciais. A percepção do aspecto motiva algumas considerações que nos aproximam do antropomorfismo, pela influência de aludirmos a nós mesmos enquanto observamos outros animais.
Ademais, por que não reconhecer apenas que não é o “aspecto”, pelas limitações inerentes, que deve construir e aperfeiçoar nossa reprovação, mas a ação de dominação?
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