Cientistas criam sistema que pode acabar definitivamente com os testes em animais

Sistema de inteligência artificial pode pôr fim à crueldade contra os animais nos testes de toxicidade (Damien Meyer/AFP/Getty Images)

Este mês, cientistas do Centro de Alternativas aos Testes em Animais da Escola de Saúde Pública Bloomberg, da Universidade John Hopkins, publicaram um artigo no jornal Toxicological Sciences explicando que eles criaram um sistema de mapeamento de relações entre estruturas químicas e propriedades tóxicas que pode acabar definitivamente com os testes em animais.

Com esse sistema de inteligência artificial, é possível mapear automaticamente as propriedades tóxicas de qualquer composto químico com muito mais precisão do que os testes em animais. Os cientistas conseguiram obter uma precisão média de 87% nos resultados, indo além dos 81% de eficácia obtidos nos testes em animais.

Segundo o principal cientista do projeto, Thomas Hartung, que também é professor do Departamento de Saúde Ambiental e Engenharia da Escola Bloomberg, esse sistema pode garantir resultados muito mais confiáveis. Além disso, o sistema de inteligência artificial é considerado tão inovador que permite testar muito mais produtos químicos do que os testes em animais.

Segundo o artigo “Machine learning of toxicological big data enables read-across structure activity relationships (RASAR) outperforming animal test reproducibility”, publicado na Toxicological Sciences, devido a custos e desafios éticos, apenas uma pequena fração dos cerca de cem mil químicos em produtos disponíveis ao consumidor foi exaustivamente testada.

Embora os testes em animais geralmente sejam exigidos por lei por alegadamente proteger os consumidores, a prática é contestada moralmente e até mesmo impopular entre fabricantes de produtos que também consideram os altos custos e resultados imprecisos desses testes. Sendo assim, a iniciativa dos cientistas pode colocar um fim ao sofrimento imposto a camundongos, coelhos, porquinhos-da-índia e cães, entre outros animais que passam anualmente por milhões de testes de toxicidade química em laboratórios do mundo todo.

“Um novo pesticida, por exemplo, pode exigir 30 testes em animais realizados separadamente, custando à empresa patrocinadora cerca de 20 milhões de dólares”, diz Hartung, coordenador do Centro de Alternativas para Testes em Animais. Por enquanto, a alternativa mais comum aos testes em animais é um processo comparativo.

Nesse caso, os pesquisadores preveem a toxicidade de um novo composto com base nas propriedades conhecidas de poucos produtos químicos que possuem estrutura semelhante. A comparação é muito menos dispendiosa do que os testes em animais, mas requer avaliação especializada e análise um tanto subjetiva para cada composto de interesse.

Felizmente, Hartung e outros cientistas montaram há dois anos o maior banco de dados toxicológico do mundo. O sistema baseado em computadores conta com informações sobre as estruturas e propriedades de dez mil compostos químicos com base em 800 mil testes toxicológicos realizados separadamente.

“Há uma enorme redundância nesse banco de dados – descobrimos que muitas vezes o mesmo produto químico foi testado dezenas de vezes da mesma maneira”, revela Thomas Hartung, acrescentando que o custo acaba sendo muito alto para um coelho, por exemplo, que tem seus olhos agredidos inúmeras vezes e desnecessariamente no teste de irritabilidade.

No projeto houve uma ampliação do banco de dados usando algoritmos de aprendizagem de máquina, assim facilitando a leitura dos dados e gerando um mapa de estruturas químicas conhecidas e de propriedades tóxicas associadas. “Nossa abordagem automatizada superou claramente os testes em animais, em uma avaliação muito sólida. Portanto, é uma grande notícia para a toxicologia”, enfatiza Hartung.

De acordo com o artigo “Database analysis more reliable than animal testing for toxic chemicals”, publicado este mês na Science Daily, a Food and Drug Administration (FDA), que regulamenta os testes realizados nos Estados Unidos, está avaliando o novo método, já considerando a substituição de diversos testes em animais. Os pesquisadores também estão começando a usá-lo para ajudar algumas grandes corporações, incluindo grandes empresas de tecnologia, a determinar se possuem químicos potencialmente tóxicos em seus produtos.

“Um dia, talvez, os químicos usem essas ferramentas para prever a toxicidade, mesmo antes de sintetizar uma substância química, para que possam se concentrar em produzir apenas compostos não tóxicos”, comenta Hartung, que desenvolveu o sistema em parceria com os cientistas Tom Luechtefeld, Dan Marsh e Craig Rowlands.

Jornalista e especialista em jornalismo cultural, histórico e literário (MTB: 10612/PR)

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