Mille Petrozza: “Há um movimento veggie no metal”

“Já ouvi muitas piadas estúpidas sobre veganos. Se pelo menos fossem engraçadas, eu riria delas” (Foto: Getty Images)

Vocalista e guitarrista de uma das maiores bandas de thrash metal da Europa, o alemão Mille Petrozza leva uma vida pacata e caseira quando não está excursionando com o Kreator. Ele fala com orgulho do dia em que preparou um seitan schnitzel para os seus pais. Eles aprovaram e admitiram que não perceberam que não havia carne no prato. “Acho que sou um cozinheiro razoável. Pelo menos foi o que ouvi”, contou em tom de modéstia.

Vegano há anos, Petrozza vê com bons olhos o crescimento do movimento vegetariano/vegano no cenário do metal. “Piadas idiotas, sexismo, bifes e barbecue – o tratamento completo. Tento evitar esse tipo de companhia, mas para a minha sorte a maioria é pelo menos respeitável [em relação ao fato dele ser vegano]. Há um movimento veggie no metal hoje em dia e está ficando maior”, declarou na entrevista “Welcome to Health – A Vegetarian/Vegan Special”, publicada pelo Voices From the Dark Side.

Para o alemão, há uma série de motivos para alguém ser vegano – direitos animais, meio ambiente e até mesmo a saúde, que acaba por ser um bônus. “Está tudo conectado”, comentou. Praticamente distante do álcool, que ele há muito tempo só consome ocasionalmente, o vocalista e guitarrista explicou que não compra nem usa nada feito a partir de couro animal. “Só tomo algum tipo de medicamento [farmacêutico] em último caso”, garantiu.

Mille Petrozza disse que evita “forçar” seu posicionamento sobre os outros, mesmo quando eles falam da “teoria da vaca feliz” – animais que são criados “felizes” até o dia de serem mortos e reduzidos à comida. Mas há situações em que ele admite que é difícil ficar calado. “Já ouvi muitas piadas estúpidas sobre veganos. Se pelo menos fossem engraçadas, eu riria delas. Tento não fazer disso um problema, mas às vezes uma discussão acaba sendo inevitável”, confidenciou.

Além de já ter participado de campanhas em defesa dos direitos animais, ele e sua esposa escrevem para a revista vegana alemã “Kochen ohne Knochen”, que significa “Cozinhando sem Ossos”. “O cara que a dirige é meu amigo, dono da Ox Magazine, a principal revista de hardcore da Alemanha. Também foi um dos primeiros a publicar livros de receitas vegetarianas. Eu meio que o inspirei a se tornar vegano, o que é uma coisa boa, então Kochen ohne Knochen agora é vegana ao invés de vegetariana. Uma grande revista, se você puder ler em alemão”, informou em entrevista a Noisey – publicada em 25 de janeiro de 2017.

Questionado se é muito difícil conseguir comida vegana quando está em turnê, Petrozza explicou que normalmente isso não é um problema. “Há uma lista bem detalhada, inclusive com sugestões para aqueles que nunca ouviram falar sobre veganismo antes – 95% das vezes, os organizadores tomam conta de tudo. Mas em uma turnê com quatro bandas e 30 pessoas, às vezes eu sou o único vegano, o que não torna as coisas muito fáceis”, revelou na entrevista “Welcome to Health – A Vegetarian/Vegan Special”.

Fã de comida indiana, ele criticou que muitas pessoas ainda são vítimas da propaganda da indústria da carne e da indústria farmacêutica. E essas mesmas pessoas já o criticaram por ser vegano, alegando que é loucura não comer carne e outros alimentos de origem animal. “Faça o seu trabalho de casa antes de vir me falar alguma coisa. O engraçado é que a maioria que faz isso não sabe nada sobre comida em geral”, desabafou. Mas, se algo der errado, o alemão come nozes, ou simplesmente sai para comprar a sua própria comida, tendo como auxílio o aplicativo HappyCow, que o ajuda a encontrar locais que preparam pratos vegetarianos. Outra preocupação do músico é a qualidade dos alimentos. “Eu costumava ter o meu próprio pedaço de terra em uma fazenda orgânica. Hoje, faço compras na Vegan Wonderland, que é uma loja de vendas online”, frisou.

De acordo com o músico, há muita gente ignorante em relação à alimentação. Por isso, quando se sentem mal, dificilmente relacionam isso com seus maus hábitos alimentares. “A comida errada pode causar doenças muito sérias, você pode se tornar diabético. O que você coloca dentro do seu corpo causa isso. Quando estou em turnê, boa comida vegana é a chave para me manter feliz, nivelado e ter energia para dar o meu melhor no palco”, afirmou a Mark Kadzielawa, do 69 Faces of Rock, em outubro de 2012.

Mille Petrozza, que não descarta a possibilidade de um dia criar um hino vegano do Kreator, já levou a questão dos direitos animais para o cenário do heavy metal. Em 2001, a banda lançou o álbum “Violent Revolution”, que traz uma música homônima que ganhou um clipe bem produzido criticando a exploração de animais. No vídeo, eles apresentam uma inversão de papéis, em que seres humanos se tornam vítimas de vivissecção, são enviados para o abate e embalados – numa analogia às bandejas de carne disponíveis em mercados e açougues.

“[O vídeo] foi uma ideia do diretor, mas se encaixa perfeitamente. Filmamos em uma fábrica em Döner-Kebab, e o cheiro era muito desagradável. Ainda é um dos meus vídeos favoritos”, disse ao Voices from the Dark Side. Entre os veganos e vegetarianos que conheceu em turnê com o Kreator, Petrozza cita todos os integrantes do Heaven Shall Burn, alguns do Caliban, John Joseph, do Cro-Mags, e Barney Greenway, do Napalm Death.

Entre as músicas que têm os direitos animais como temática, Petrozza qualificou “Murder”, da banda inglesa de grindcore Extreme Noise Terror como um clássico. A música que faz parte do álbum “A Holocaust in Your Head”, de 1989, fala que 450 milhões de animais eram assassinados a cada ano na Grã-Bretanha, e tudo isso para descer pela garganta e sair pela bunda das pessoas.

Em entrevista publicada pela Noisey em 25 de janeiro de 2017, perguntaram ao vocalista do Kreator o que ele achou da declaração de Donald Trump, alegando que a crise climática, que segundo a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) tem como agravante a agropecuária, é uma farsa.

“Pessoas estão morrendo por causa do aquecimento global, há provas científicas. É outra das coisas estranhas que Trump diz, uma daquelas coisas que não fazem sentido no mundo real. Talvez faça sentido no mundo de Trump. Mas no mundo real, isso é um problema concreto”, respondeu.

Mille Petrozza acredita que o número de pessoas aderindo ao veganismo cresce a cada dia, o que é algo extremamente positivo, embora ele seja cético sobre a possibilidade de ter a chance de viver em um mundo vegano.

Saiba Mais

Mille Petrozza nasceu em 18 de dezembro de 1967 em Essen, na Alemanha.

O Kreator foi fundado em Essen em 1982. Entre os anos de 1985 e 2017, a banda lançou 14 álbuns.

Jornalista e especialista em jornalismo cultural, histórico e literário (MTB: 10612/PR)

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