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O fim da vaca

Ilustração: Jo Frederiks

Com cinco anos era considerada velha. Avaliaram tetas, pelagem, articulações, cascos e cabeça.

Ficou parada como estátua de carne e osso, até que mexeu devagar a cabeça, como se tentasse desvendar algo.

“De menos, bem de menos. Rendimento quase nulo. Por que manter?”, disse o dono, que já havia diminuído a ração para economizar. “Pode levar. Vale mais pra lá do que pra cá.”

Também criticou o temperamento da vaca, dizendo que nos últimos meses virou um animal de “difícil trato”. “Não aceito isso por aqui, ainda mais de animal velho. Vai embestar agora? Ora!”

Fez careta, sinal com a mão e o peão entendeu que era pra colocar no caminhão. Virou as costas e não olhou mais para a vaca que nasceu ali.

O rapaz teve pena de empurrá-la rampa acima e, quando ela empacou, deixou de pressioná-la. Olhou para ele, tentou recuar, caiu da rampa e bateu a cabeça.

Ficou observando o animal caído, sem vida. Os olhos da vaca miravam o pasto. Suas pernas bovinas tremeram ou o peão imaginou que sim.

“Seria melhor viajar pra morrer noutro lugar?”, alguém perguntou, sem querer resposta.

“Aqui é o início e o fim”, dizia uma frase no caminhão.

Jornalista (MTB: 10612/PR) e mestre em Estudos Culturais (UFMS).

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