Por que frangos são tão ignorados pela consciência humana?

Além disso, partindo da pecuária, são os animais menos considerados no mundo todo por supostos “protocolos de bem-estar animal”

 

Dos animais mais consumidos no mundo, e criados no contexto da pecuária, o frango, sem dúvida, é o mais ignorado pela consciência humana. Quando abordo a realidade dos frangos, percebo que algo grita dentro de mim, dizendo-me que se eu falasse de bovinos ou suínos a atenção seria maior, e mais pessoas poderiam refletir a respeito. Como duvidar disso, se até mesmo entre os defensores dos animais parece que a acolhida é maior quando o assunto é sobre os mamíferos mais explorados e consumidos a partir desse sistema?

As pessoas inclinam-se mais à sensibilização em relação a bovinos e suínos do que galináceos – chocam-se mais com imagens de exploração e morte de bois, vacas e porcos; e porque veem mais estranhamento e distanciamento em relação às aves criadas para alimentação – que são animais com penas, com bicos, com olhares avaliados como mais insondáveis.

Não são mamíferos, portanto, os consideram mais distantes de nossas próprias emoções. O fato de serem menores parece dar a impressão de que seu sofrimento é menor. É como se a expressão de dor de um porco ou de um bovino sempre superasse a de um frango ou de uma galinha – é o que interpreto a partir da reação das pessoas. Mas a verdade é que isso não faz o menor sentido.

Frangos não sofrem menos, têm vidas miseráveis e são, de longe, os mais abatidos no mundo, entre as criaturas terrestres que submetemos a “aperfeiçoamento genético”, que prefiro chamar de “sofrimento genético”, para consumo. E no mundo todo atraem menos atenção do que outros animais abatidos. Se hoje há uma estimativa de que matamos por ano mais de 80 bilhões de animais por meio da pecuária, os frangos estão no topo.

Eles vêm ao mundo desconectados de uma condição natural de vida. São submetidos a miseráveis e superpopulosos cativeiros até o dia do abate, que costuma ocorrer com cerca de 40 dias. Imagine a experiência de vir ao mundo para viver por pouco mais de um mês. Além disso, partindo da pecuária, são os animais menos considerados no mundo todo por supostos “protocolos de bem-estar animal”.

Claro que garantia de “bem-estar animal” de verdade seria não submeter animal a nenhum tipo de exploração e morte. Mas os frangos são os mais negligenciados até na questão de “falso bem-estar animal”, o que também é reflexo do distanciamento humano que citei antes. Isso não é novidade para quem conhece um pouquinho do sistema de produção de proteína animal. Numa escala de consideração, acredito que as pessoas diriam facilmente que prefeririam salvar primeiro bovinos e suínos e depois frangos.

E como podemos ver com normalidade um animal que vive apenas 40 dias ser submetido a antibióticos? Não exatamente porque está doente, mas porque é um produto ainda vivo que será abatido e consumido. Ou seja, isso é parte do processo de desenvolvimento. Os frangos experimentam uma ingente precocidade de misérias e transformações num período tão curto de vida que sempre pergunto-me como até hoje sustentamos esse sistema alimentar tão arbitrário.

Também é incômodo o fato de as pessoas pouco falarem sobre o quanto é antinatural, numa realidade já antinatural, um animal ser condicionado a um desenvolvimento tão rápido em pouco tempo. Acredite, rápido ganho de peso, que é exigência do mercado, não é nada positivo para as articulações de um frango.

Pra mim, frangos são crianças com bico e asas. Talvez você queira discordar, mas então peço que justifique como posso não considerar uma criança alguém que é degolado com pouco mais de um mês de idade. Os matadouros estão sempre cheios, mas, em quantidade de indivíduos, a vítima que ocupa o primeiro lugar, e continuará ocupando enquanto não abdicarmos da violência desnecessária no nosso sistema alimentar, é o frango.

E o sofrimento desses animais aumenta em tempos de crise econômica, porque é a carne considerada mais barata dentre os “produtos da pecuária” e da “industrialização da proteína animal”. Ou seja, em qualquer cenário de consumo de animais em grande escala, os frangos estão em terrível situação.

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Jornalista e especialista em jornalismo cultural, histórico e literário (MTB: 10612/PR)

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