Tem dor de galinha no ovo

Ilustração: Luke Chueh

Uma escola decidiu levar um grande grupo de crianças para conhecer uma granja de ovos. Chegando lá, Rubinho, que era sempre o mais curioso de sua turma, já estranhou o cheiro. “Professora, por que aqui é fedido?” “Que isso, Rubinho!” “É só o cheiro delas. Tadinhas…”

“Mas não acho que a culpa é delas. Deve ser por causa dessas gaiolas onde elas ficam presas, né? Tudo apertadinha. Como elas conseguem?” A professora olhou para um lado, para o outro e notou que as outras crianças também queriam saber. “Acho que é o costume, por que elas vivem aí.” “É? Elas nunca saem dali? Nunca?”, continuou Rubinho.

O guia técnico da granja ouviu as perguntas. “Não se preocupe, garoto. Aqui elas têm do bom e do melhor. Olhe como elas estão gordinhas, saudáveis. E não é apertado. Tem espaço pra fazer de tudo, até boas amizades. Olhe aí como são boas amigas”, disse o homem.

“Ué, mas se é bom assim, então o senhor trocaria de lugar com elas?” “Que isso, Rubinho! Não fale assim”, repreendeu a professora. “Não, não tem problema”, comentou o guia. Enquanto observava seis galinhas numa gaiola, com as asas quase enroscadas nas grades, Rubinho ouviu um barulho estranho.

Uma galinha não parava de tentar bicar outra, mas o bico estava cortado. “Por que elas fazem isso?”, questionou Rubinho. “Ah, é só a brincadeira delas”, disse o guia. “E aquele bico cortado?” “Ah, isso não é nada…uma parte do bico cai quando chega certa idade…”

“Você tá mentindo! Minha avó tem uma galinha e a bichinha tem o bico inteiro.” “É raça diferente, filho, raça diferente.” Da sua turma, Marcinha comentou que eles cortam o bico quando ainda é pintinho e Rubinho ficou chocado.

“Ô, por que vocês fazem essa maldade com elas? E se alguém cortasse sua boca?” A professora advertiu Rubinho mais uma vez. O guia deu um sorriso amarelo e tentou esconder o incômodo de ter aquele menino visitando a granja. “Ovo é estranho, né? Comer uma coisa que sai de dentro delas, e elas ficam aí só pra isso, mais nada”, disse Marcinha.

Rubinho notou uma galinha no fundo da gaiola, nem se mexia e tinha olhos estranhos, esbranquiçados. Também estava bem magra e já não possuía muitas penas. “Olha, parece que tem galinha morta ali. Tadinha da bichinha. Por que vocês abandonaram ali? Como ela morreu?”

O guia disse que não era galinha morta. “Ah, é uma galinha de borracha que a gente coloca pra brincar com as outras.” “Borracha? Então a gente quer ver de perto.” O guia explicou que era proibido, pra evitar contaminação, e as crianças começaram a fazer barulho, até que a professora exigiu silêncio.

No final da visita, Rubinho perguntou o que acontece com as galinhas quando deixam de botar ovo. “Elas morrem. Matam elas”, respondeu Marcinha. O guia jurou que não. “Não, que isso! A gente doa, doa mesmo.” “Ué, então deixa eu levar uma, já que vocês estão doando”, pediu Rubinho.

O homem pareceu incomodado e arrependido do que disse, mas falou com seu superior e liberaram uma galinha. A professora também autorizou. Já fora da granja, entregaram a galinha nos braços de Rubinho, que foi embora sorrindo com a “Elmira”, nome que deu à ave antes de voltar para casa.

Com um ano e meio de idade, ela seria enviada para abate antes do final de semana porque já era considerada “velha” e “pouco produtiva”. “Minha mãe vai ficar feliz em te ver, Elmira”, garantiu Rubinho olhando nos olhos da galinha, que olhava nos seus. E ficou mesmo.

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Jornalista e especialista em jornalismo cultural, histórico e literário (MTB: 10612/PR)

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