Parou à noite em frente a um açougue. Na vitrine iluminada, viu a cabeça de um porco decorada. Para os clientes que entravam e saíam, aquela cabeça era irrelevante.
Ficou intrigado com o cuidado que alguém teve com a cabeça do porco. “Parece que alguém quis deixá-la bonita.”
Ao lado da cabeça havia cortes de diversas partes retiradas de diversos porcos. “Não pode ser apenas de um.”
Coçou a própria cabeça e imaginou o que o dono da cabeça na vitrine fez um dia para coçar a sua própria.
Mas o que é própria? Quem é o dono dessa cabeça? O porco? O fazendeiro? A indústria? O açougueiro?
“E se o açougueiro não for o dono do açougue? Depende de onde se fala? O porco nasce com a cabeça, mas quem deixa o porco decidir sobre a própria cabeça?”
Observou as minúsculas frutas e outros vegetais coloridos em contato com a cabeça do porco, numa fantasia corada. Havia estranha sutileza numa exposição impossível sem violência.
Percebeu que a cabeça do porco recebeu um tratamento diferenciado, e não em relação ao que também é morto.
“É porque a morte vale mais que a vida. Não imagino que o porco tenha recebido um tratamento tão bom em vida, e logo agora que ele nada pode sentir.”
Mas não é porque ele nada pode sentir? E o que disso seria para ele senão nada? Não é assim sobre tantos animais?
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