Quem nunca viu um caminhão boiadeiro transportando bovinos em alguma rodovia? Quando são novilhos ou já se tornaram bois, é mais comum encontrarmos esses animais a caminho do matadouro depois de deixarem a fazenda com idade de 14 meses, no caso do novilho superprecoce, ou a partir de 30 meses, quando já são considerados adultos.
Mansos, os bovinos normalmente passam despercebidos a caminho da morte, e só são reconhecidos pelo cheiro, que pode surgir a partir de vestígios de matéria orgânica ou pela própria situação do confinamento, em que são obrigados a se apertarem no mesmo espaço, intensificando odores.
Às vezes, alguém nota um breve som de cascos se batendo, alguns animais agitados ou assustados; outros, ainda curiosos, observando alguma coisa ao seu redor, inclusive quem se aproxima como resultado do acaso.
Ainda assim, a atenção que eles ganham nesse trajeto tende a não durar mais do que alguns segundos, e logo suas expressões e fisionomias fogem à lembrança de quem os encontra pelo caminho – uma consequência da normatização da violência e da matança de tantos animais criados para consumo.
Afinal, a crença prevalecente socialmente é de que é aceitável enviá-los para a morte para que suas partes se tornem produtos disponíveis em açougues e mercados.
A partir dessa legitimação, que ainda encontra pouca mas crescente oposição, somente no Brasil são mortos 62 bovinos por minuto, 3,72 mil por hora, 89,33 mil por dia, 2,68 milhões por mês e 32,24 milhões por ano, de acordo com cálculos baseados nas estimativas trimestrais de abate de animais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A indústria da carne, respondendo à demanda de consumo da sociedade, chega a matar de 7,7 a 8,35 milhões de bovinos apenas em um período de 90 dias, como ocorreu em 2019, analisando um período de maior e “menor” matança.
Primeiro, os animais são descarregados pelos currais de recepção. Depois passam por um processo de lavagem também conhecido como banho de aspersão – que permite a chamada “esfola higiênica”, um eufemismo. Então são mantidos em uma rampa até a secagem da pele, que já antecipa sua morte.
Na sequência, os bovinos passam pelo processo de “atordoamento” ou “insensibilização”, que consiste em deixar o animal inconsciente utilizando marreta ou pistola pneumática. Esse método não é permitido na “produção” de carne kosher ou halal – que prevê degola sem insensibilização.
Quando o animal cai no chão se debatendo após um disparo de pistola, logo ele é pendurado e degolado. Vômitos também são comuns antes da sangria, quando os grandes vasos sanguíneos do pescoço do bovino são cortados. Nessa etapa, cada animal perde de 15 a 20 litros de sangue.
“A morte ocorre por falta de oxigenação no cérebro. Parte do sangue pode ser coletada assepticamente e vendida in natura para indústrias de beneficiamento, onde serão separados os componentes de interesse (albumina, fibrina e plasma). Após a sangria, os chifres são serrados e submetidos a uma fervura para a separação dos sabugos (suportes ósseos), e depois de secos podem ser convertidos em farinha ou vendidos”, informa o artigo “Abate de Bovinos”, do Boletim Técnico da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), assinado por Miryelle Freire Sarcinelli, Katiani Silva Venturini e Luís César da Silva.
As etapas seguintes incluem esfola e remoção do couro e cabeça, evisceração e refrigeração – partes de um processo que perpetua a completa objetificação e obliteração de vidas não humanas.
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