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“Lei do mais forte”, uma mentira usada também para favorecer o especismo

Baseada em um olhar tendencioso sobre a natureza, essa crença visa favorecer a exploração, a ânsia por desigualdade e a antidemocracia

Foto: Andrew Skowron

Para negar direitos ou consideração de interesses aos animais submetidos à exploração, é comum a alegação de que o que fazemos com esses animais “não é diferente do que ocorre na natureza”. Ou seja, o “mais forte” impondo-se sobre os demais e fazendo prevalecer seus interesses.

Claro que podemos dizer que não estamos na natureza silvestre, então utilizar esse argumento não faz sentido, já que vivemos uma realidade em que podemos não explorar nem financiar a exploração de animais para viver. Além disso, a própria percepção de “forte” é questionável, se não somos realmente mais fortes do que muitos animais que são explorados.

Mas ignoremos agora o segundo parágrafo. A natureza resume-se a um estabelecimento de imposições? É sobre “a lei do mais forte”? Sobre “a besta-fera que devora tudo”? Não é tal crença um artifício usado há muito tempo para endossar a ideia do domínio humano a partir da crença de que isso é apenas ser o que se é e agir como tal?

Desde uma das interpretações mais famosas de Gênesis e a conciliação feita por Tomás de Aquino com o que era conveniente do pensamento aristotélico, o Ocidente assumiu a presunção de que “nada é feito que outras espécies não façam”. E se é feito pelo ser humano de forma “racional”, isso ocorre somente pelo que é uma “hierarquização natural”.

Ou seja, para subjugar animais vive-se a contradição de incluir-se e simultaneamente excluir-se da animalidade. E se há um reconhecimento de animalidade, isso ocorre mais por efeito comparativo do que determina-se como permissivo, sem ideia de integração ou de consideração em relação ao que sobre mim não deixa de ser também sobre o outro.

Sugiro uma reflexão do biólogo italiano Stefano Mancuso no livro “Revolução das Plantas” que, longe de qualquer romantização sobre o assunto, apenas aponta que há mais de democracia na natureza do que admitimos. Ele sustenta que na natureza tomar decisões compartilhadas é a melhor garantia para sobreviver e resolver problemas complexos (inteligência coletiva).

Isso é o que muitos animais fazem, indo na contramão da crença reducionista da impulsividade, do instinto e de tudo que em relação à natureza não humana pareça um vazio racional.

“A ideia de que a democracia é uma instituição contrária à natureza, portanto, permanece apenas como uma das mais sedutoras mentiras inventadas pelo homem para justificar a sua antinatural sede de poder individual.”

Jornalista (MTB: 10612/PR) e mestre em Estudos Culturais (UFMS).

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