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Dizer que alguém se comporta como bicho é depreciar outros animais

Diríamos isso se não fosse pela normalização do especismo?

Foto: We Animals

“As pessoas estão se comportando como bichos” é uma frase que normalmente é dita para reprovar o comportamento de humanos que causam mal a outros humanos, ou quando causam também algum outro tipo de dano deliberado ou não.

Comportar-se como bicho é comportar-se de forma reprovável, da pior forma possível, algo condenatório, que não pode ter sentido positivo. O bicho é referência pejorativa ao animal não humano, não o próprio humano no seu sentido de bicho. Se é bicho é porque é outro bicho, porque o ser humano não é pensado nesses termos como bicho.

É uma frase usada de forma diversa, em casos variáveis, de violência, assassinato, caos ou algum condenatório comportamento coletivo de humanos. Também há usos no singular, em referência específica a um indivíduo.

Quem diz que alguém se comportou como bicho e que isso foi dito com sentido positivo? Até mesmo quando o sentido é sobre a aparência de alguém no “parecer bicho” há uma depreciação do não humano.

No sentido de se comportar como bicho, o bicho, que é não humano, é o mau exemplo, mas diríamos isso se não fosse pela normalização do especismo?

Há uma crença de que podemos referenciar outros animais quando queremos destacar o que existe de errado em relação ao comportamento humano, e que se é reprovado é pela ilusão de que isso é “agir como bicho”, mesmo quando o “bicho” pensado como “o animal que o humano não é” não tem qualquer atitude condizente com o que é apontado.

Quando dizemos que alguém se comporta como bicho é como dizer que isso não é inerente ao ser humano. Se algo é praticado e reprovado, levando a afirmação do “se comportar como bicho” é porque baseia-se no que não pode ser admitido como humano.

O “bicho” então é a abstração do animal não humano, e cada pessoa pode pensar no animal que quiser e que julgue caber nessa afirmação, ou em nenhum em específico, numa ideia geral de “animalidade da qual não fazemos parte”.

A ideia de “pessoa se comportando como bicho” também é estranha porque sequer pode fazer sentido se diz mais sobre o comportamento humano do que não humano, se nem mesmo diz respeito à real ação ou motivação de outros animais.

Jornalista (MTB: 10612/PR) e mestre em Estudos Culturais (UFMS).

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