Quando consumimos algo de origem animal estamos enviando uma mensagem de que não há problema em usar animais para fins alimentícios. Muitas pessoas, mesmo entre os que criticam a exploração animal, ignoram o que existe de simbólico nisso quando sustentam que há determinados consumos que não são reprováveis.
Os dois exemplos mais comuns – criar animais em casa (dependendo da localidade) ou em uma pequena propriedade rural para “obtenção de ovos e leite”. Há muitas pessoas que não veem nada de errado nisso, usando como justificativa que trata-se de uma “prática doméstica” com sentido de “não exploratória”.
Porém esses animais já são biologicamente concebidos pelo viés da exploração. Eles não geram esse volume de leite ou de ovos porque é “natural”, mas porque foram manipulados pelo ser humano.
Então esse é outro ponto em que discordo de quem não vê nada de errado nesse consumo, porque não consumir é uma clara e não relativista expressão de oposição, enquanto consumir é apoiar o que é precedentemente exploratório sobre a condição desses animais. E como “obter” leite de uma vaca sem submetê-la à lactação que depende da reprodução?
Se a prática do veganismo já deixa claro que não precisamos consumir nada de origem animal, qual é o sentido de consumir quando nos opomos à exploração animal? Não é enviar uma mensagem contraditória e que favorece uma relativista permissividade?
Afinal, é como dizer aos outros que o problema não está no consumo e sim no método para se obter o que se deseja consumir. Mas esses animais realmente produzem algo para nós?
Também é problemático ignorar que foi a defesa de que podemos consumir o que é de origem animal que trouxe-nos à realidade exploratória atual – do doméstico ao intensivo/industrial. Quando alguém faz esse tipo de defesa de consumo de leite e ovos, penso em alguns indivíduos que se opuseram ao uso de animais há centenas de anos e muito antes da revolução industrial.
Eles compreendiam que o ato de consumir algo de origem animal já era problemático em sua representação de consumo, independentemente do contexto. O poeta sírio Al-Maʿarri, por exemplo, escreveu no século XI um poema publicado na “Luzūmiyyāt” em que condena também o consumo de leite e ovos.
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