A morte das galinhas que não botam mais

Foto: Sinergia Animal

Lembrou de quando um caminhão vazio chegou para recolher as galinhas que já não botavam ovos. Nem muda forçada funcionava. Então decidiram enviar para descarte.

“As primeiras pilhas se formaram no fundo da carroceria, e as bichinhas já cansadas nem faziam esforço para evitar o aperto. Mas também, de que adiantaria? Acho que só machucaria. Não abriam asas nem arranhavam a grade plástica com o bico amputado. Só ficavam ali, descansando sem descansar até a morte chegar.”

Horas depois, a carroceria ficou cheia após o recolhimento em três granjas. Com um ano e meio em média, nasceram em lugares tão distintos quanto iguais. Morreriam no mesmo dia, sem conhecer outra vida distante da granja, das gaiolas e da mesma ração, que poderia ser forçada ou nem ofertada, no caso de aves “condenadas”.

“E a luz sempre artificial que é um engano constante? E o sol que nunca chegava até elas? E as galinhas que morriam ali, ao lado delas?” Mostrou-me um pé de galinha que disse ter encontrado numa caixa após a retirada de aves da carroceria.

“Naquele dia, o sangue ainda não tinha secado.” Perguntei se era de galinha viva e disse que não responderia. “Fique à vontade para crer ou descrer.” Sem hesitar, comentou que galinhas estão entre os animais que mais sofrem por causa do ser humano. “O quanto é generoso quem ganha dinheiro com ovos e quando a galinha não dá mais lucro viva a envia pra morrer?”

Definiu como terrível má sorte vir ao mundo em forma de galinha. “Experiências, traumas e tudo o mais para a eficiência da produção, porque sem eficiência a vida da galinha já vale só a degola – um fim comum após um ano e meio.”

Logo voltou-se para as lembranças do recolhimento de aves. Vi sua tristeza quando contou sobre a fragilidade de um corpo envelhecido e umedecido.

“Uma das galinhas que tirei da caixa olhou nos meus olhos e não se moveu mais. Seus pés estavam moles. Nem reagiram ao vento quente soprado por uma máquina ao lado. Foi quando percebi que ela já tinha morrido.”

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Jornalista e especialista em jornalismo cultural, histórico e literário (MTB: 10612/PR)

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