Vencedor do Nobel de Literatura de 1978, Isaac Bashevis Singer era judeu e ele próprio fez referência ao Holocausto judeu para chamar a atenção para a crueldade contra os animais no conto “O Escritor de Cartas”, que no Brasil integra a obra “47 Contos de Isaac Bashevis Singer”, lançada pela Companhia das Letras e considerado um dos melhores da coletânea.
O conto foi publicado originalmente em 13 de janeiro de 1968, na revista New Yorker, e atraiu atenção por narrar a história do sobrevivente do holocausto Herman Gombiner, que desenvolve uma outra consciência a partir da convivência com um rato.
A relação permite um deslocamento do que é interesse humano para o que é não humano, em um exercício de alteridade. Uma das passagens mais controversas e marcantes do conto é a afirmação de que “para os animais, há uma eterna Treblinka”.
“O que eles sabem? Todos esses filósofos, todos os líderes do mundo? Convenceram-se de que o homem, o pior transgressor de todas as espécies, é a coroa da criação. Todas as outras criaturas foram criadas apenas para fornecer-lhe comida e couro, para serem atormentadas e exterminadas. Em relação a elas, todas as pessoas são nazistas” (1968, p. 26).
O termo “eterna Treblinka”, que Bashevis Singer utiliza no conto em referência à exploração e matança diária de animais seria referenciado mais tarde por outro Nobel de Literatura, J.M. Coetzee, por meio de sua personagem Elizabeth Costello, na discussão sobre direitos animais.
O termo também daria título ao livro publicado por Charles Patterson em 2002, que aborda a influência de Henry Ford e dos matadouros de Chicago na idealização do sistema de extermínio nazista.
Os matadouros de Chicago, que se tornariam referência para o sistema global de industrialização da morte com fins de consumo, já haviam sido denunciados em 1906 pelo escritor e reformador social Upton Sinclair no livro “The Jungle”, por crueldade animal e exploração de imigrantes.
Em uma das passagens, Teta Elzbieta questiona chorando: “E o que será de todas essas criaturas?” Jokubas Szedvilas responde: “Esta noite, todos serão mortos e fatiados. E logo ali, do outro lado dos depósitos de acondicionamento, há mais ferrovias, e de lá vêm os vagões que vão levá-los embora” (2001, p. 44).
Leia também “Bashevis Singer: ‘Sou vegetariano pela saúde dos animais‘”, “Duas perguntas sobre comer animais para Bashevis Singer“, “Natalie Portman cita Bashevis Singer: ‘Nós fazemos com as criaturas de Deus o que os nazistas fizeram conosco‘” e “Hitler e Stálin perseguiram vegetarianos“.
2 respostas
EXCELENTE ARTIGO!!! EXPLICITA A CRUELDADE DO CONSUMO DE CARNE!!! POR ISSO A HUMANIDADE É INFELIZ!!
É uma pena que “The jungle” ainda não tenha sido traduzido e publicado no Brasil. Um livro que influenciou muita gente e a sociedade norte-americana da época.