Canis que visam lucro deveriam existir?

A lógica desse mercado é a mesma de outros meios em que animais são matrizes utilizadas como meio de geração de renda (Foto: Reprodução)

Em apenas um ano a Polícia Ambiental de São Paulo recebeu 4670 denúncias de maus-tratos em canis com finalidade comercial. Não é nenhuma novidade que canis comerciais visam dinheiro. Alguém seleciona uma raça que considera com maior potencial de lucratividade e investe nisso. A lógica desse mercado é a mesma de outros meios em que animais são matrizes utilizadas para geração de renda. E como em qualquer atividade em que o lucro é a prioridade, o bem-estar animal pode ser facilmente negligenciado. O grande volume de denúncias de maus-tratos em canis é a prova disso.

No entanto, quem aponta as falhas desse negócio, e decide intervir em defesa de animais que só existem para serem comercializados como se fossem produtos, encontra muita resistência. A tentativa desesperada é de desmoralização em defesa das “fábricas de filhotes”, onde mães e filhotes têm suas necessidades primárias negligenciadas.

Afinal, como animais criados aos montes e com finalidade comercial podem ter todas as suas carências individuais satisfeitas? Nesses locais, não é tão incomum os filhotes não passarem o tempo necessário com suas mães, serem forçados ao desmame precoce e não terem boas possibilidades de socialização porque são mantidos confinados e em situação de constante estresse.

É importante considerar ainda que as cadelas são condicionadas a procriarem de acordo com o objetivo do canil – logo é o animal forçado a se adaptar ao ser humano, não o ser humano respeitando a individualidade do animal. Se há intervenção humana e interesse humano em jogo, é claro que isso não acontece de forma natural, até porque canis comerciais têm suas metas de venda. Não se deve ignorar também que cadelas exploradas exaustivamente têm suas expectativas de vida reduzidas. Afinal, elas são criadas com um propósito bem claro.

Porém, alguém pode alegar que o seu canil é exemplar. Independente da veracidade da afirmação, se um animal é utilizado como fonte de renda, é claro que ele é explorado, e arbitrariamente, já que em canis são os seres humanos que condicionam os animais a procriarem de acordo com os seus interesses econômicos – escolhendo inclusive os “melhores” parceiros de cruzamento. Uma pessoa pode dizer que gosta ou ama um animal que ela cria para vender seus filhotes, mas você acha que a cadela, se pudesse escolher, concordaria com isso? Ela aceitaria de bom grado ver a partida de um filho para longe dela? Então, eu te pergunto, você acha realmente que canis que visam lucro deveriam existir?

Além da compra de um animal vinculá-lo a um status de mercadoria ou objeto, já que ele é visto como um “bem negociável”, não como uma vida inegociável, que seria o mais adequado partindo do reconhecimento de sua existência como sujeito de uma vida, outro problema é que vivemos em um país onde há mais de 30 milhões de animais abandonados ansiando por um lar. Ainda assim, há quem prefira vender ou comprar “cães de raça” sob a justificativa de amar os animais.

Jornalista e especialista em jornalismo cultural, histórico e literário (MTB: 10612/PR)

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *