Produção e consumo de carne têm altos custos de saúde, ambientais e sociais

Estudo da FAO motiva reflexão sobre os custos ocultos da agropecuária

De acordo com um estudo publicado pela Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), o consumo de carne processada e vermelha está entre os três principais riscos à saúde a partir da alimentação.

Segundo o estudo, os sistemas industriais elevaram o consumo de carne e criaram um cenário em que sua alta disponibilidade tem agravado os riscos à saúde associados a esse consumo. “O consumo de carne processada e vermelha tem aumentado constantemente com a transição dos sistemas tradicionais para os industriais, o colocando entre os três principais riscos alimentares.”

O que pode ser visto pelos consumidores como positivo (opções mais baratas, mais acesso) esconde ainda algo que muitos não sabem ou não reconhecem – as consequências do constante consumo de produtos de origem animal e os seus altos custos econômicos em saúde, e não somente em relação à carne vermelha e à carne processada. Afinal, se as pessoas desenvolvem problemas de saúde associados à alimentação, isso tem um custo também em tratamento de saúde, e que tem aumentado a cada ano.

Outros grandes problemas são os custos sociais e ambientais. A produção e consumo de produtos de origem animal tem desempenhado um papel de grande impacto quando se pensa nos custos ocultos do sistema agroalimentar (saúde, social e ambiental), que já é anualmente de 12 trilhões de dólares (SOFA, 2024), considerando a realidade de 156 países, o que inclui o Brasil, onde a agropecuária desempenha um papel de grande impacto.

Além do desmatamento, é citado o impacto econômico das emissões de gases de efeito estufa derivados desse tipo de atividade, escoamento de nitrogênio (por meio da urina e das fezes dos animais criados para fins de consumo), mudança no uso da terra (incluindo a má utilização ou subutilização) e poluição da água. Há países em que os custos de um sistema agroalimentar que supervaloriza a agropecuária chegam a um valor equivalente a 20% do PIB, e isso em relação somente ao custo ambiental.

Já os custos sociais citados no estudo são aqueles em que esse sistema agroalimentar gera consequências que afetam a vida de muitas pessoas, inclusive economicamente, e mesmo quando elas não participam dessa atividade ou desse tipo de consumo. Esses custos, dependendo do país, chegam a 18% do PIB. Os maiores problemas relacionados ao sistema agroalimentar são indissociáveis da agropecuária.

Também não há como ignorar que a destinação de grandes áreas para criar animais que serão mortos para consumo revela uma desigualdade fortalecida por esse sistema, até porque a agropecuária demanda muito mais solo e outros recursos naturais do que se o foco fosse produzir vegetais para alimentar diretamente humanos. A seca também agravada pela pecuária não pode ser pensada somente como um problema ambiental se afeta também o social. Ademais, o impacto ambiental também acaba sendo um impacto social pela forma como afeta a vida de tantas pessoas, mesmo quando essas pessoas não percebem a extensão desse impacto.

O estudo leva-nos a pensar em como esses problemas estão relacionados e em como há mais a ser considerado quando alguém acha que não há motivo o suficiente para repensar o impacto da alimentação. O estudo também chama atenção para problemas que estão se intensificando e que cada vez mais estão sendo relacionados à carne e outros produtos de origem animal – como doenças cardíacas, acidentes vasculares cerebrais (AVC) e diabetes.

Claro que os produtos de origem animal não são os únicos que podem afetar de forma bastante negativa a saúde humana, já que o estudo chama atenção para padrões alimentares não saudáveis, e cita como preocupante o baixo consumo de grãos integrais, portanto não podemos pensar somente em carne e em outros produtos de origem animal. No entanto, quando se considera o quadro geral de impactos em relação ao sistema agroalimentar, não há como ignorar que a agropecuária e a indústria de produtos de origem animal desempenham um papel que não pode deixar de ser ressaltado.

E se pensamos na nossa realidade brasileira, nas especificidades nacionais em relação à agropecuária, que é a prática agrícola que ocupa a posição número um em ocupação de solo e desmatamento, assim como no Brasil ser um destaque no elevado número de animais criados para consumo, é impossível não reconhecer a situação como bastante grave. E se os números dessa produção e consumo aumentam, os custos ocultos também.

O estudo cita ainda como uma preocupação a baixa ingestão de frutas e outros vegetais, o que também tem relação não apenas com uma questão de acesso como também de se supervalorizar produtos de origem animal em detrimentos de alimentos vegetais. É importante que ocorram mudanças e elas podem surgir a partir de ações e iniciativas individuais, como observado no estudo. Mas também é chamada atenção para a necessidade de políticas facilitadoras e de investimentos que ajudem a favorecer uma nova realidade de consumo.

A conclusão a partir do estudo é que a transformação dos sistemas agroalimentares é fundamental para que haja uma redução dos custos ocultos desses sistemas. Mas, por ora, o consumidor também pode olhar para a sua própria alimentação e pensar em como ele pode mudá-la.

Observação

Podemos concluir também que o elevado consumo de produtos de origem animal também gera custos em saúde que sobrecarregam os sistemas de saúde.

Clique aqui para ter acesso ao estudo “The state of food and agriculture (SOFA) 2024”.

Leia também:

OMS destaca benefícios de uma dieta sem carne e sem laticínios

Estudo conclui que veganos são mais saudáveis

Dieta à base de vegetais é benéfica à memória

O agronegócio é um câncer no Brasil?

Jornalista (MTB: 10612/PR) e mestre em Estudos Culturais (UFMS).

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Faça uma doação à Vegazeta.
Sua contribuição é importante para o nosso trabalho.