Agropecuária brasileira atinge maior emissão de gases de efeito estufa de todos os tempos

Agronegócio responde por quase três quartos (73%) das emissões de gases de efeito estufa do Brasil (Foto: Victor Moriyama/NYT)

As emissões brasileiras de gases de efeito estufa em 2020 cresceram 9,5%, enquanto no mundo inteiro despencaram em quase 7% devido à pandemia de covid-19. A alta no desmatamento no ano passado, em especial na Amazônia, pôs o Brasil na contramão do planeta e o deixa em desvantagem no Acordo de Paris. É o maior montante de emissões desde 2006. Com o aumento da emissão e a queda de 4,1% no PIB, o Brasil ficou mais pobre e poluiu mais.

O dado vem do Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SEEG), do Observatório do Clima, que todo ano calcula quanto o Brasil gerou de poluição climática. Em sua nona edição, o SEEG calculou em 2,16 bilhões de toneladas de gás carbônico equivalente (GtCO2e) as emissões nacionais brutas no ano passado, contra 1,97 bilhão em 2019. É o maior nível de emissão do país desde 2006.

Dos cinco setores da economia que respondem pelas emissões do Brasil, três tiveram alta, um teve queda e um permaneceu estável. O setor de energia, que respondeu por 18% das emissões do país no ano passado, teve uma queda de 4,6%.

Isso ocorreu em resposta direta à pandemia, que nos primeiros meses de 2020 reduziu o transporte de passageiros, a produção da indústria e a geração de eletricidade. Com 394 milhões de toneladas de CO2e, o setor energético retornou aos patamares de emissão de 2011.

“O setor de energia foi aquele que apresentou a maior queda percentual de emissões em 2020. Esse resultado é um claro reflexo da diminuição de atividades emissoras devido à pandemia de covid-19, quando foi necessário que as pessoas evitassem se deslocar. Destaca-se a diminuição de emissões nos transportes de passageiros. O consumo de combustível na aviação caiu pela metade. A demanda por gasolina e etanol também diminuiu de maneira relevante”, comenta Felipe Barcellos, pesquisador do Instituto de Energia e Meio Ambiente (Iema), que estima as emissões para os setores de energia e processos industriais.

Impacto da agropecuária 

Já as emissões da agropecuária, que atingiram 577 milhões de toneladas de CO2e (27% do total nacional) em 2020, tiveram uma alta de 2,5%. É a maior elevação desde 2010 num setor cujas emissões nos últimos anos vêm oscilando pouco. O rebanho nacional cresceu em cerca de três milhões, o que aumentou também as emissões de metano por fermentação entérica (o popular “arroto do boi”).

“O setor agropecuário atingiu a maior emissão de gases de efeito estufa de todos os tempos, mesmo em ano de pandemia”, diz Renata Potenza, coordenadora de projetos do Imaflora, organização responsável pelo cálculo das emissões da agropecuária.

Apenas na Amazônia, conforme levantamento do Observatório do Clima, a emissão por alterações no uso do solo alcançou no ano passado 782 milhões de toneladas de CO2e. Se a floresta brasileira fosse um país, seria o nono maior emissor do mundo, à frente da Alemanha. Somando o Cerrado (113 milhões de toneladas de CO2e) à conta, os dois biomas emitem mais que o Irã e seriam o oitavo emissor mundial.

“Mudança de uso da terra mais uma vez desponta como a principal fonte de emissão do Brasil. Em 2020, tivemos as maiores emissões do setor em 11 anos, um reflexo claro do desmonte em curso da política ambiental, que tem favorecido a retomada das altas taxas de desmatamento”, afirma Ane Alencar, diretora de Ciência do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), organização responsável pelo cálculo das emissões do setor no SEEG.

O descontrole sobre o desmatamento faz com que a curva de emissões do Brasil ainda seja dominada por uma atividade que é majoritariamente ilegal e que não contribui com o PIB nem com a geração de empregos. Somando-se os 27% das emissões diretas da agropecuária com as emissões por desmatamento, transporte e tratamento de resíduos associadas ao setor rural, o agronegócio responde por quase três quartos (73%) das emissões de gases de efeito estufa do Brasil.

Jornalista e especialista em jornalismo cultural, histórico e literário (MTB: 10612/PR)

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