Não ignore a dor dos animais

Ilustrações: Tommy Kane/Sue Coe

“Como reagiria cada ser humano que experimentasse a realidade da criação para consumo na pele duma criatura tão subjugada? Sentindo suas limitações e impossibilidades. Já não poderia rir ou debochar dessa miséria porque seria a sua própria. Se não a reconhece dessa forma por indiferença, que é estranhamento que vem duma ausência de empatia, o que diria ou não diria sentindo-a como violação máxima de sua existência e vontade?”

Não pensava num tipo específico de animal, e sim em muitos dos que sucumbem à implacabilidade da conveniência humana, fortalecida por alheamento que também é estímulo obliterante.

“Por que devo pensar em alguém em específico ou somente numa espécie? Tento evitar desconsideração num mundo tão imerso num mal que celebramos porque evoca prazer e satisfação. E como a humanidade exultou-se com opressões que hoje condena…”

Formatos de cabeças e corpos, pernas, pelos, penas, escamas, peles – tudo ia e voltava de sua mente e girava numa sequência de imagens que trazia número indefinido de faces desfeitas e refeitas.

“Poderia passar a vida testemunhando expressões de animais explorados e mortos a cada segundo para o gáudio da humanidade. Ainda assim, não deixaria de considerar-me ignorante em relação à dimensão do barbarismo. E devo aceitar as inconsistências e bobagens daqueles que menosprezam o impacto dessa crueldade? Quanta empáfia domina o ser humano que minimiza a dor do outro, não humano, para tentar usá-la como exceção quando este universo de miséria é assomado por milhões e bilhões.”

A ideia do não ser é algo que legitima comportamentos imorais no ser humano que usufrui de nocivos vícios culturais e quer preservá-los, porque não sendo alvo de desconsideração tão ingente por sua vida julga-se criatura mais elevada e digna de ignorar valores que não são seus, mas que são imprescindíveis à não violência contra os outros.

“Para onde iria esse olhar de distanciamento se quem o preserva e orgulha-se do desrespeito ao que não é humano pudesse sentir na pele a dor da vida não humana reduzida a alvo de consumo? É o tipo de consideração que deveríamos abrigar na consciência.”

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Jornalista e especialista em jornalismo cultural, histórico e literário (MTB: 10612/PR)

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