Olimpíadas mostraram por que uso de animais não deve ser considerado esporte

Na foto, o cavalo Saint Boy parece satisfeito em participar das Olimpíadas? (Foto: Stanislav Krasilnikov/Tass)

Ainda é muito comum pessoas acreditarem que não há nada de errado no uso de animais em atividades classificadas como “esportes”, mesmo que, claro, não haja o consentimento do animal e que ele tenha sido condicionado a participar de determinada prática que, não raro, inclui rotina exaustiva, violência e ainda pode, mais tarde, resultar no sacrifício do animal.

Um exemplo disso foi o que ocorreu nas Olimpíadas de Tóquio, onde, além de do sacrifício do cavalo Jet Set, da delegação suíça, lesionado em uma prova de equitação, outro cavalo, Saint Boy, da delegação alemã, foi vítima de soco desferido pela própria treinadora, Kim Raisner, no pentatlo.

A violência foi praticada sob a alegação de que o animal, visivelmente estressado, não atendia aos comandos da amazona Anikka Schleu. Esses dois episódios tiveram repercussão global e levantam questionamento sobre a aceitação de “esportes com animais”, e não apenas nas Olimpíadas. Afinal, as reflexões e críticas não devem envolver apenas avaliações pontuais, mas que tipo de amplo impacto essas práticas geram.

A lição deixada pelas Olimpíadas, e que, não tenho dúvida, diz respeito a algo que ocorre no mundo todo, é que um animal que tenha comportamento considerado inaceitável em atividade que visa uma realização individual para o praticante e entretenimento para o público sempre será vítima de ação arbitrária que envolve privação e/ou violência. Assim, ignora-se, por conveniência, que esses animais também são seres complexos e sociais, e não têm vocação ou inerência para corresponder o tempo todo aos anseios humanos.

Devemos aperfeiçoar nossa consideração 

Quando agem dessa forma, como se não estivessem tendo comportamento natural diante de uma situação desconfortável, são punidos, como se suas vidas devessem ser somente atender aos nossos interesses. Além disso, quantos animais utilizados em “esportes” nem chegam a se aposentar por que são sacrificados em decorrência de lesões? Quantos animais são abatidos por que já não são considerados “bons” em determinada prática?

Há pouca ou nenhuma consideração por vidas não humanas quando já não são consideradas benéficas ao ser humano, e isso vem do infeliz entendimento de que animais existem ou deveriam existir para nos servir. Mas como classificar como esporte uma atividade que consiste em dominar outra criatura que nem mesmo teve poder de escolha sobre a própria participação?

É exatamente por diferenças de código de comunicação (que favorece dissimulação), de um tipo de inferiorização que, por tradição, leva à presunção, e de pouco interesse sobre as implicações das ações humanas para outras espécies que “esportes com animais” continuam sendo realizados e admirados.

Enquanto não mudarmos nossa consciência em relação à complexidade e o respeito por outras espécies, a violência contra os animais “nos esportes” não terá fim. A única forma de evitar violência nessas práticas é deixando de usá-los, de subjugá-los, de tratá-los como mero meio para um fim.

Estranho também é o ser humano gozar de realizações envolvendo animais, quando todo ou a maior parte do esforço físico é feito pelo animal, a quem não faz sentido prêmios, medalhas, dinheiro, conquistar plateia ou qualquer uma dessas ambições humanas na busca por um destaque que não é resultado de seu próprio e único esforço.

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Jornalista e especialista em jornalismo cultural, histórico e literário (MTB: 10612/PR)

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