Outros animais também merecem libertação

Ilustração: Jo Frederiks

Um boi observava um peixe no riacho. Parado como estátua, não o vi mexer músculo. Parecia hipnotizado com a maneira como aquele animal movia-se na água.

Qual será sua impressão? Mas por que isso importa? Intrigante era estar ali e perceber como uma criatura assiste outra vida diferente da sua. Um foi trazido ao mundo pelo ser humano e o outro não.

Um poderia ir longe, desde que não houvesse má intervenção humana na natureza. O outro? Não. Apenas se fugisse, mas a cicatriz de produtificação no couro não dificultaria localização.

Logo atrás, um porco observava o boi que observava o peixe. Quem poderia dizer como chegou ali? Mas por que isso importa? Suas narinas estavam sujas de lama, com porção ressequida perto dos olhos.

Eram bem expressivos e compenetrados. Se estivéssemos no escuro e pudesse ver apenas olhos, não creio que eu diria de primeira que trata-se de um porco.

Mas por que não? Suínos são animais atentos, o que diz o contrário não é a realidade, e sim a irrealidade que vem do consumo e da descaracterização não humana.

O porco continuou no mesmo lugar e logo atrás vi uma galinha que observava o porco que observava o boi que observava o peixe. Ela ciscou e parou. O suíno nem se mexia e a galinha o assistia.

Talvez fossem as marcas e os riscos em suas costas que chamavam-lhe atenção, porque eram vermelhas e destacavam-se naquele pedaço de mata rasteira.

A galinha não tinha muitas penas e parecia, por consequência da imposição à vida, habituada aquela ausência que vem da força humana – o que não significa concordância. Por que significaria?

E quem estava atrás da galinha? Acho que não preciso dizer. Não sei por quanto tempo ficaram lá. Talvez para sempre, pela duração de suas vidas – ou não. Só pensei em como seria justa uma forma não religiosa de redenção.

Gosta do trabalho da Vegazeta? Colabore realizando uma doação de qualquer valor clicando no botão abaixo: 




Jornalista e especialista em jornalismo cultural, histórico e literário (MTB: 10612/PR)

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *