Se olhamos para um frango com olhos intumescidos e o bico aberto, imobilizado por mãos humanas, mãos que o forçarão à morte, o que podemos perceber?
Um animal que, incapaz de fazer prevalecer o próprio interesse, manifesta descontentamento por expressões comuns à sua natureza inatural. Sem ter como livrar-se do estado de dominação que determina seu fim, é isso que resta.
Então podemos concluir que é a “reação última” de oposição do animal e, como num paradoxo, a “reação última” é também “reação primeira”, porque um animal não morre duas vezes.
A experiência é singular, irrepetível, mas também é múltipla e repetível, porque outros também passaram e passarão por isso, embora o que assimilamos a partir de seus olhos, boca e corpo possa variar.
Se olhamos para essa realidade a partir de uma concepção fatalista, banalizamos a experiência do animal para afugentá-la à nossa própria sobre a “verdade de seu fim”, submetida à “verdade da primariedade do consumo”.
E essa primariedade que inexiste sem imposição pode ser confrontada pela recepção momentânea, que motiva um pensar que terá ou não impacto por sua dimensão consequencial – pode desaparecer logo mais ou persistir. Quanto mais atenção toma-nos uma representação, mais considerações podemos fazer.
Porém, não é só a representação por si, como se fator isolado fosse, que determina isso, mas também o que preexiste em nós, porque as precedências favorecem tais pertinências. A ideia do que podemos definir como o desespero de um frango gera algo em mim e algo em outro, sem caráter idêntico.
Mesmo em caso de diferença interpretativa, quem pode afirmar que há disposição não humana em ser dominado e obliterado? O que nos diz a imobilização inerente ao processo de matança para consumo? Se a ideia do desespero fosse uma ausência, a violência também seria? Se acreditássemos que sim, estaríamos artificializando reação ignorando a ação.