Tolstói acreditava na evolução do vegetarianismo

Para Tolstói, alimentar-se de animais é uma injustiça e uma imoralidade (Acervo: Tolstoy Foundation)

Um dos maiores nomes da literatura mundial, Liev Tolstói também chamou a atenção nos séculos 19 e 20 por ser um defensor do vegetarianismo. Levando uma vida frugal nas suas últimas décadas de vida, ele se alimentava basicamente de pães, cereais, frutas e outros vegetais.

Sobre a carne como alimento, Tolstói a desqualificava sob qualquer aspecto, e ponderando tanto sobre o sofrimento dos animais quanto a supressão da capacidade espiritual humana – que, para ele, deveria se voltar também para a simpatia e compaixão por outros seres vivos sencientes.

“Ao violar esses sentimentos, o ser humano abre as portas para a crueldade. Mas afirmando que Deus ordenou o abate dos animais, o que acima de tudo é somente um hábito, as pessoas perdem inteiramente o seu sentimento natural”, escreveu Tolstói em ensaio publicado no livro “Recollections and Essays”, lançado em 1937, 27 anos após sua morte.

Na obra, há diversos textos, como o ensaio “O Primeiro Passo”, de 1892, em que ele aborda suas experiências com o vegetarianismo. E se alguns deles se voltam para a introspecção e interiorização, outros consistem em retratos da comezinha hipocrisia. Um exemplo são os relatos sobre o que ele testemunhava tanto nas áreas urbanas quanto rurais da Rússia tsarista – envolvendo também a exploração de animais.

“Não se pode duvidar que o vegetarianismo tem progredido”

Segundo o escritor russo, o ser humano, por ter hábitos onívoros, ignora o fato de que o primeiro elemento da vida moral é a abstinência. “Não faz muito tempo que falei com um soldado aposentado. Ele ficou surpreso quando eu disse que é uma pena matar animais e reduzi-los à comida. Justificou que era a ordem natural das coisas. Falei que sentia mais pena ainda quando os animais surgiam silenciosos, como gado manso. ‘Eles vêm, coitados, confiando em ti. É muito lamentável.’ Até o final da nossa conversa, ele já estava concordando comigo”, narra.

Tolstói também relata uma experiência que teve quando decidiu visitar um matadouro em Tula, ao sul de Moscou. Naquele dia, ele convidou um amigo para acompanhá-lo. A proposta foi declinada e o homem alegou que não suportaria ver o abate dos animais. “Vale a pena observar que ele era também um desportista que caçava pássaros”, enfatiza o escritor, desvelando a contradição especista do amigo.

De acordo com o russo, em qualquer lugar, sempre há uma senhora refinada devorando a carcaça de um animal, crente de que está agindo corretamente. Ela é tão frágil que diz não ter condições de se alimentar somente de vegetais. Também é tão sensível que jamais conseguiria causar dor a si mesma ou a qualquer outro animal. Na realidade, seria incapaz até de vê-lo sofrer. E ela é fraca justamente porque foi ensinada a se alimentar daquilo que não é natural ao homem. E, ainda assim, ela não consegue evitar de causar dor aos animais porque prefere continuar comendo-os.

Para Tolstói, alimentar-se de animais é uma injustiça e uma imoralidade que tem sido aceita pela humanidade durante toda a vida consciente dos seres humanos. Apesar disso, há séculos cresce o número de pessoas que não reconhecem o ato de comer carne como sendo certo. No século 19, o escritor russo percebeu que a humanidade já passava por um progresso moral lento, mas ininterrupto.

“Não se pode duvidar que o vegetarianismo tem progredido dessa forma. O progresso do movimento deve provocar especial alegria naqueles que se esforçam por trazer o verdadeiro reino de Deus à Terra. […] O vegetarianismo é um sinal da aspiração séria e sincera da humanidade em direção à perfeição moral”, defendeu Liev Tolstói.

Referências

Tolstoy, Leo. Recollections and Essays. Nabu Press (2011).

Jornalista e especialista em jornalismo cultural, histórico e literário (MTB: 10612/PR)

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