Uma vaca já não consegue se levantar enquanto o que chamam de “sobra de leite” escorre, misturando-se às fezes.
Forma um caminho entre as fezes, sinuoso. A vaca é uma máquina? Estática, dolorida, com as tetas apontando para a câmera.
Uma pata fica entre o encostar ou não nas fezes, como num titubear de estar lá sem querer estar.
O leite desce pelo que não é desejo da vaca, um leite que deve escorrer até não poder.
Se desse sem que quisesse, não desejariam que a vaca fosse ordenhada sem parar?
A vaca olha por baixo, desconfiada, assustada, cansada. O corpo revela o não controle da vaca.
Um corpo que dela não pode ser. E quando não tiver algo a oferecer sem querer, não terá algo mais tirado sem querer?
E o olhar já não estará em lugar nenhum, nem os úberes escorrendo leite nem a pata vacilante.
A posição desaparecerá, assim como o corpo vivo. Em seu lugar, outra vaca. Repetição e exaustão – leite pra tirar e depois um corpo pra despedaçar.
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