Vegan Sidekick: “Se você ama os animais, como pode comê-los?

“A forma como meus desenhos são elaborados já revela que o conteúdo é satírico” (Arte: Vegan Sidekick/Divulgação)

Richard Watts, mais conhecido como Vegan Sidekick, é um ilustrador e designer gráfico britânico que em abril de 2013 criou uma página para promover o veganismo e os direitos animais por meio de ilustrações e quadrinhos cômicos, ácidos e satíricos. A princípio, ele não tinha a mínima ideia de que um dia o seu trabalho influenciaria milhares de pessoas.

Vegan Sidekick conta que foi um vegano apático por muito tempo, e como nenhum dos seus amigos ou familiares demonstrou interesse pelo veganismo, ele decidiu pensar em um meio de motivar as pessoas a refletirem sobre o assunto. “Embora eu não prejudicasse os animais, eu não estava ativamente ajudando. Senti que poderia fazer algo, mas queria me focar na lógica da não violência”, relata.

Um dia, nos tempos de faculdade, Richard estava comprando leite e queijo, e começou a refletir sobre como aquilo era desnecessário. Havia muitas opções ao seu redor e ele se sentiou mal por comprar exatamente os produtos baseados na exploração de animais. “Então parei de comprá-los. Até então, eu nunca tinha conhecido um vegano, e eu não sabia que os machos [bezerros e pintinhos] morrem na indústria de ovos e laticínios, e que as fêmeas são mortas quando sua produção se torna menos lucrativa. Hoje em dia, é o que digo aos vegetarianos, eles não devem apoiar isso”, enfatiza.

Vegan Sidekick, que vê o veganismo como uma extensão do raciocínio lógico, gosta de criar imagens com elementos propositalmente mal desenhados, tornando suas criações ainda mais engraçadas e acessíveis. “A maioria das pessoas nem sabe que sou ilustrador, mas acho que a forma como meus desenhos são elaborados já revela que o conteúdo é satírico. Decidi ir por esse caminho quando criei um stickman [boneco palito] e ele se tornou mais popular do que tudo que eu tinha feito. Então continuei”, justifica.

Nos finais de semana, Watts cria pelo menos sete imagens, assim publicando uma por dia no Facebook, no Instagram e em seu site. Mas o ritmo de produção também pode variar, se surgirem muitas novas ideias. “Não tenho uma rotina com regras muito rígidas. Tenho apenas um bloco de notas em que mantenho uma lista de ideias que são inspiradas nos absurdos que leio na internet [sobre veganismo]. Há comentários que são tão incômodos que não consigo acompanhar por muito tempo sem contra-argumentar. Então, para não perder tempo, às vezes prefiro ignorar o que acontece ficando offline”, pondera.

Os quadrinhos e as ilustrações são autoexplicativos e bem diretos, direcionados para um público composto por pessoas das mais diferentes faixas etárias. Naturalmente, o britânico também se depara com críticas negativas, que revelam uma contrariedade intransigente. “Espero fazer as pessoas rirem, mas o humor é muito subjetivo. Então só posso dar o meu melhor e esperar que as pessoas façam a ligação com as imagens em vez de se focarem em se sentirem ofendidas”, declara.

Para lidar com perguntas clichês ou questionamentos triviais, Richard Watts criou um guia e o compartilhou em sua página no Facebook e em seu site para que as pessoas evitem repetir perguntas, sejam elas entusiastas do veganismo ou principalmente pessoas à toa, simplesmente dedicando tempo a atacar veganos e simpatizantes. “Quando minha página cresceu em popularidade, apareceram pessoas tentando justificar o abuso animal. Também criei o guia porque, francamente, ainda há muitos veganos que não são bons em defender seus pontos de vista. Pelo menos é o que vejo na internet”, diz.

Vegan Sidekick reconhece que há dias em que se vê como alguém irônico demais ou até mesmo estoico, e em situações como essa há pessoas que tentam atingi-lo enviando muitas mensagens ásperas de contrariedade. “Se alguém repete as mesmas justificativas [contra o veganismo] inúmeras vezes, isso significa que estão apenas buscando briga, fazendo com que se sintam melhores. Então tento manter a calma e evito insultar. Há [mais de] sete bilhões de nós no planeta, então se uma pessoa tapa seus ouvidos com as mãos, encontre alguém que não faça isso”, sugere.

Por outro lado, ele também recebe muitas mensagens positivas, de pessoas dizendo que suas imagens mudaram suas mentes. Esse tipo de retorno é visto como a maior recompensa, porque, segundo Sidekick, suas conquistas já ultrapassaram suas expectativas. “Nunca vou me acostumar com o fato de que há muitas pessoas que me têm em tão grande estima por causa do meu trabalho”, pontua.

Entre as imagens preferidas do ilustrador está uma em que um vegano tenta romper o muro de desculpas, rotineiramente usado por pessoas que criticam o veganismo porque não querem sair de suas zonas de conforto. “Estamos em uma sociedade em que muita gente prefere apenas dizer que ‘as coisas são assim’. Dê um passo para fora e veja suas opções, e você vai perceber que a exploração de animais é completamente injustificada. Devemos nos mover em direção ao futuro, sermos mais compassivos e menos violentos. Explorar vítimas inocentes por um prazer trivial não deve fazer parte disso”, desabafa.

Mesmo ciente de que tem ajudado a transformar a vida de muitas pessoas, Richard Watts diz com modéstia que não sabe se seu trabalho pode ser considerado ativismo. No entanto, desde o início ele já se sentia em uma missão e não conseguia evitar de fazer questionamentos confrontadores como: “Se você ama os animais, como pode comê-los? Então recebia respostas do tipo: “Não dou a mínima, cale a sua boca!” “Por isso, decidi me tornar um exemplo mais positivo, e espero que pessoas assim se interessem pelo que estou fazendo”, enfatiza.

Esse novo caminho foi inspirado no fisiculturista vegano Robert Cheeke, dos Estados Unidos, a quem ele considera uma grande influência na abordagem positiva do veganismo. “Não acho que um dia terei a mesma positividade que ele”, comenta. O médico vegano Michael Greger, também estadunidense, é outra inspiração para Watts. Idealizador do site NutritionFacts.org, Greger é uma referência em nutrição baseada em vegetais e há anos vem confrontando os maus hábitos alimentares que se tornaram parte da cultura ocidental.

“Meu objetivo continua sendo ajudar as pessoas a perceberem o que acontece. Os animais não merecem toda essa exploração praticada pela indústria com seus ridículos argumentos”, pontua e acrescenta que reconhece ser impossível saber o real impacto de seu trabalho.

Mesmo sem controle das imagens que criou desde 2013, ele não consegue ver isso como algo que não seja verdadeiramente positivo. “Posso dizer que realmente servi ao meu propósito. Essencialmente, continuo trabalhando e tentando transmitir a mensagem de forma humorística e inventiva. Nunca imaginei que publicaria livros baseados no meu trabalho”, revela.

Para quem tem vontade de ser ativista, mas acredita que ainda não encontrou o próprio caminho, Richard afirma que o mais importante é não desistir. “Se eu tivesse desistido completamente, não teria todos esses quadrinhos. Não há um beco sem saída. Você pode usar até mesmo a sua saúde e o seu corpo para promover o veganismo. Cuide de sua alimentação, treine, corra, nade, pedale, levante pesos. Assim quando alguém questionar como você ficou assim, terá bons argumentos, e a conversa vai fluir com facilidade”, recomenda.

Jornalista e especialista em jornalismo cultural, histórico e literário (MTB: 10612/PR)

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