Criamos um mundo pobre para os animais

Para Heidegger, a experiência de mundo dos animais não humanos é pobre. Não penso agora nos animais que influenciaram sua percepção, mas se considero aqueles que são criados para consumo, posso me questionar se a experiência de mundo desses animais é mais determinada por quem são ou pela intervenção humana.

A intervenção não precede o ser se o ser surge pela intervenção? Não é por precedê-la que define quem são e serão esses animais? No entanto a intervenção humana não é capaz de abstrair dos animais vivos toda a constituição do ser, embora possa reduzi-los ao não ser – porque sem o ser não pode-se garantir o que depende do não ser. Afinal, é preciso ter vida para ter exploração, ter vida para ter morte.

Quando Heidegger fala em mundo pobre dos animais, ele referencia as limitações deles em relação a quem somos. Porém, se reflito sobre isso em relação a animais domésticos para fins de consumo, não é também quem somos que determina a limitação deles?

Fala-se em mundo pobre sobre o que é chamado de limitações não humanas, mas, mesmo reconhecidas como limitações, justificam a construção de um mundo pobre para não humanos? De aprisionamentos, violências institucionalizadas, matadouros, etc.

Uma percepção de mundo pobre deve levar a outro mundo pobre? Se sim, então acreditamos que vulnerabilidades precisam ser tratadas de forma arbitrária como inferioridades, o que leva ao violento domínio sobre quem é inferiorizado.

E o que é esse mundo pobre senão o resultado de um olhar que parte de uma subjetivação em que afirmamos que no outro não nos encontramos? E por não nos encontrarmos nele o submetemos ao mundo pobre que criamos (por meio do consumo) para ele.

Jornalista e especialista em jornalismo cultural, histórico e literário (MTB: 10612/PR)

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