Empresas de produtos veganos deveriam buscar articulação política

Foto: Pixabay

Não é difícil encontrar consumidores que reclamam dos preços dos produtos veganos que chegaram ao mercado nos últimos anos, principalmente daqueles que mimetizam alimentos de origem animal. Se o objetivo é promover um consumo inclusivo, sem dúvida, isso é um problema, porque limita bastante o alcance e restringe o interesse.

Algumas empresas alegam que o preço praticado hoje, que pode ser alvo de críticas do consumidor, tem relação com custos de produção, por exemplo, envolvendo acesso à matéria-prima e alguns ingredientes. Há quem cite que, por exemplo, utiliza proteína importada.

Outros falam que é necessário escalonar a produção. Assim argumentam que melhores preços dependem do eficiente aumento da produção, oferta e consumo, o que facilitaria o acesso a quem hoje não se vê como consumidor de produtos que considera caros.

Não é novidade a associação de produtos veganos com a sustentabilidade, com o uso mais eficiente de recursos naturais – quando não em todo o processo produtivo, pelo menos em parte dele, já que só de não usar ingredientes de origem animal (que dependem da criação e alimentação de animais que consomem a maior parte dos grãos produzidos no mundo), há um ganho ambiental em relação à redução do uso da terra, água e emissões de carbono.

Ou seja, é algo que deveria tornar a produção de alimentos veganos um assunto de interesse nacional, de relevância política, ainda mais em um país onde o desmatamento está tão relacionado com a agropecuária. Afinal, é a atividade que demanda mais terras no país, gerando grande impacto ambiental.

Considerando isso, um bom caminho seria incentivar o mercado de produtos veganos por meio de iniciativas públicas. Por exemplo, reduzindo tributos, concedendo algum tipo de isenção fiscal, oferecendo subsídios com base na pegada ambiental. Enfim, favorecendo a redução de preços e beneficiando também os consumidores.

Frente Parlamentar da Agropecuária 

De 2019 para cá, a Câmara dos Deputados recebeu dois projetos de lei (PL 2556/2019 e PL 534/2020) voltados à redução de tributos sobre produtos alimentícios veganos. Ou seja, dois PLs em três anos. O primeiro já foi arquivado sob alegação de não oferecer dados sobre o impacto econômico da proposta. Já o segundo continua tramitando sem tramitar, já que está ativo na Câmara, mas não está evoluindo.

Por outro lado, tente imaginar quantos projetos de lei foram apresentados de 2019 para cá em benefício da agropecuária, das cadeias de pecuária de “corte” e de leite, por exemplo. São dezenas de projetos e há novos a cada mês. Ou seja, existe uma grande pressão em benefício de um sistema de produção que é um dos mais nocivos para o planeta.

Por que isso acontece e parece distante de desacelerar? Porque a Câmara dos Deputados, por exemplo, tem a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), também conhecida como bancada ruralista e bancada do boi, que é uma das comissões mais influentes da casa – com 280 membros.

Além disso, é bastante conservadora em relação ao futuro do sistema alimentar, como pode ser percebido por meio de suas propostas. Hoje, a FPA tem parlamentares que antagonizam o mercado de produtos veganos, e o fazem sob a alegação de contrariedade em relação ao uso de palavras como “leite”, “carne” ou termos associados quando usados em referência a produtos de origem não animal.

E por que agora? Porque o mercado de produtos veganos está crescendo, se organizando melhor e trazendo mudanças que as pessoas, inclusive os parlamentares mais conservadores da FPA, estão percebendo que não são passageiras.

Articulação política 

Não dá para negar que muitos dos resultados obtidos no meio político em benefício da agropecuária no país vêm da articulação da bancada ruralista e, como são numerosos, eles podem tanto facilitar a aprovação de seus projetos quanto dificultar a aprovação de propostas daqueles que são vistos como antagônicos aos seus interesses.

Por isso, acredito que as empresas dedicadas à fabricação de produtos exclusivamente veganos deveriam buscar articulação política ou pelo menos apoiar ações políticas em benefício de seu mercado e que surgem sem sua participação direta, porque não há como ignorar que a resistência a essa crescente forma de consumir também é exercida no espaço político institucional.

Se alguém propõe, por exemplo, um PL em benefício de maior circulação de produtos veganos a preços mais acessíveis, por que não fortalecer essa iniciativa e formar uma base de apoio para o aperfeiçoamento desse projeto? Afinal, quanto mais bem elaborada uma proposta em benefício da população, mais chances terá de ser aprovada.

No Canadá e em alguns países da Europa já existem associações de empresas de produtos veganos ou plant-based que se articulam para encontrar meios, também por meio da política, de favorecer maior produção e circulação de seus produtos, assim como garantir subsídios e financiamentos públicos mais justos e inclusivos para produtores e fabricantes, além de apoio para realização de feiras e eventos.

O entendimento é de que a participação política também faz a diferença quando o objetivo é chegar a novos consumidores, porque muitos tornam-se esses consumidores somente quando esses produtos são compatíveis à sua renda.

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Jornalista e especialista em jornalismo cultural, histórico e literário (MTB: 10612/PR)

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