Entidades se revoltam com crueldade contra equídeos em Minas

Imagens: Fernanda Braga/BSTA/Fred Roiz/Val Consolação/Eslaine Campolina

Um vídeo de um cavalo agonizando em Ibirité (MG), divulgado neste mês de dezembro nas redes sociais, teve bastante repercussão e foi a gota d’água para grupos de proteção animal da região metropolitana de Belo Horizonte (MG).

Gravado por uma criança que se compadeceu da situação do animal, o vídeo mostra o cavalo caído ao chão rodeado por muito sangue, no bairro Monsenhor Horta. As informações são de que o animal teve os testículos cortados por um homem sem qualquer experiência na área de medicina veterinária. Além disso, também não teria sido utilizado nenhum equipamento adequado para o procedimento. Após o ato, o animal foi abandonado em via pública na cidade, e populares tentaram levantá-lo sem êxito, já que perdeu muito sangue.

Movimentos de proteção animal de Belo Horizonte foram acionados para tentar socorrer o cavalo. Enquanto os grupos elaboravam a logística do resgate – médico veterinário para atendimento, transporte, local para tratamento e acolhimento, recursos financeiros etc. -, foram informados de que o animal veio a óbito.

“Quando recebi a ligação dessa criança e vi a situação do cavalo, imediatamente, a associação começou a buscar uma forma de auxiliá-lo. Temos grupos de trabalho no WhatsApp e outras entidades também foram acionadas para esse caso. O município de Ibirité não se movimenta e já perdemos as contas de quantos animais de grande porte a Brasil Sem Tração Animal resgatou ou auxiliou sem qualquer ajuda ou iniciativa dos agentes públicos desse município – que são responsáveis por tais procedimentos”, explica a presidente da associação BSTA, Fernanda Braga. 

“Esse caso foi chocante por ter sido uma criança a se movimentar e tentar fazer algo pelo animal que acabou vindo a óbito, antes que conseguíssemos organizar toda a estrutura necessária que demandaria seu resgate e primeiros socorros. Esses animais estão morrendo pelo Brasil afora pela inoperância do Estado em agir por eles. Ibirité é um grande exemplo disso!”

Dois dias após esse episódio, um novo caso surgiu na cidade envolvendo outro equídeo que precisou de assistência do município e, novamente as entidades e protetores locais ficaram sem auxílio do poder Executivo local. O cavalo apareceu caído com as patas machucadas no bairro Durval de Barros e, ao ser acionada, a Secretaria de Meio Ambiente informou que estava em busca do tutor. Mas não houve providências quanto ao atendimento médico veterinário ou resgate do cavalo. Quando uma ONG conseguiu providenciar um veterinário para o atendimento, o animal já não estava no local. Não houve mais notícias sobre seu estado de saúde, e tão pouco quanto ao seu tutor – que deveria ser responsabilizado pelo fato.

A Prefeitura de Ibirité, por meio da Secretaria de Meio Ambiente e Serviços Urbanos, informou que a Política de Proteção aos Animais do Município está vigente desde julho de 2019, por meio da Lei 2.249/19. De acordo com a prefeitura, a atual gestão sempre esteve compromissada com a situação dos animais em Ibirité. Em 2020 e 2021, devido à pandemia de covid-19, algumas atividades foram paralisadas, mantendo-se apenas os de caráter essenciais.

A Secretaria de Meio Ambiente e Serviços Urbanos declarou também que já mapeia os animais de grande porte em situação de abandono pelo município, e que no primeiro semestre de 2023 o abrigo para esses animais funcionará para receber denúncias de maus-tratos e fazer o tratamento daqueles que precisarem. A Secretaria afirma que a pasta se organizou também para identificar e autuar os infratores, responsáveis pela segurança e bem-estar de seus animais. E, por fim ressaltou que realiza de forma frequente políticas de educação ambiental voltadas à proteção dos animais. Isso é contestado pela moradora e protetora de animais do município, Eslaine Campolina:

“Nunca pegamos um animal aqui microchipado. A gente mora numa área muito grande aqui, que tem muitos locais rurais. Não fazem isso. Nem os que são resgatados por nós. Muitas vezes a gente não consegue nem um laudo de maus-tratos dos veterinários, dos RTs responsáveis do município. O telefone que temos para ligar é o telefone da Secretaria de Meio Ambiente, e na secretaria eles passam o nosso contato como protetores ou pedem pra gente ligar pra Zoonoses, que a gente sabe que não tem logística e estrutura pra isso. Porque isso deveria ser abraçado como nós sabemos pela Secretaria do Meio Ambiente. Com relação ao espaço ser inaugurado no primeiro semestre de 2023, só se eles começarem a construir hoje e fizerem muito rápido, porque ninguém está sabendo, e isso não começou a ser feito. A lei 2249 tem um texto maravilhoso. Mas nada é efetivo. Temos projetos prontos desde a mesma época [2019] também não efetivados”, dispara Elaine, que tem forte atuação no município envolvendo a proteção animal.

“Então, com relação a animais de grande porte nós não temos suporte nenhum como protetores. Não temos! O município não fornece suporte nenhum. Não microchipa ainda nem os animais de pequeno porte. Agora, o pessoal da Zoonose é guerreiro. Eles têm ajudado e dado um suporte muito grande, de acordo com a estrutura que eles têm, que poderia estar muito melhor, porque a lei citada é de 2019, não é verdade? Pandemia teve em todo lugar e teve local que cresceu. Não teria motivo para isso, não! Retroagir é complexo. A gente tem este certo suporte para os animais de pequeno porte. Mas para animal de grande porte não tem nada! E estou até muito admirada que tenham tido a coragem de falar que estão microchipando os animais de grande porte. É sério mesmo? Quantos eles vão apresentar microchipados? E, onde que está este cadastro? Que dia que eles já fizeram um boletim de ocorrência a respeito disso? Porque a única vez que conseguiu ir com uma das protetoras, o animal completamente no estado dele de maus-tratos e, não foi alegado como maus-tratos pelo RT responsável.”

(*) Em relação ao cavalo do bairro Monsenhor Horta, de acordo com a prefeitura, os servidores da Secretaria estiveram no local após o ocorrido e não encontraram o animal. Até o fechamento da matéria não foi possível confirmar o que foi feito com os restos mortais do cavalo.

Outro município que se destacou entre os grupos de proteção, nestes últimos dias, com relação à não assistência e socorro a animais de grande porte foi Sabará, na região metropolitana de Belo Horizonte. A denúncia foi publicada por alguns protetores em suas redes sociais, onde um cavalo estaria caído por dias em um lote, agonizando, em uma das avenidas da cidade, sem providências por parte do município. 

Somente após a mobilização dos protetores e entidades, cobrando a ação da Zoonoses local é que o socorro ao animal teria sido providenciado:

A Prefeitura de Sabará respondeu que nos casos de maus-tratos envolvendo esses animais a Polícia Ambiental é acionada pelo município e, se identificados, os tutores são multados. A prefeitura informou ainda que, para os animais que forem apreendidos pelo município há um prazo de cinco dias para o tutor pagar a multa e retirar seu animal recolhido. Caso não faça isso no prazo o animal é encaminhado para uma ONG. Os animais não são microchipados no município.

“Embora Belo Horizonte tenha uma infraestrutura maior para lidar com animais de grande porte em comparação com os municípios da região metropolitana (que não tem nenhuma), o que estamos notando é que a capital retrocedeu nos poucos avanços que havia dado nesta pauta. Desde agosto deste ano estamos recebendo relatos de que o CCZ não está mais recolhendo cavalos soltos em via pública, o que coloca em risco também a vida da população humana, seja pelo risco de acidentes ou zoonoses. A Prefeitura de Belo Horizonte fez o anúncio de um abrigo para equídeos localizado no bairro Capitão Eduardo que nem temos mais notícias sobre o funcionamento. Não há fiscalização da microchipagem dos cavalos e cadastramento dos condutores de veículo de tração animal prevista na lei 11.285/2021. A sensação que temos é que mais do que nunca os cavalos explorados em Belo Horizonte estão em completo estado de abandono”, desabafa Caio Diogo do movimento BH Sem Tração Animal.

A situação dos equídeos (cavalos, muares, asininos) tem sido pauta frequente de grupos e entidades de proteção animal, assim como de advogados e lideranças políticas pelo Brasil afora, já que são inúmeras ocorrências de maus-tratos, negligência e omissão envolvendo esses animais, sem que haja por parte das autoridades e agentes públicos providências efetivas para a resolução do problema que envolve não só a responsabilização dos tutores, mas também o resgate, atendimento e guarda dos animais vitimados que, contam apenas com o auxílio de representantes do terceiro setor que não recebem, quase nunca, suporte do Estado, como explica o advogado de Brasília (DF), José da Silva Moura Neto, do escritório Moura Neto Advogados Associado.

“A omissão renitente do Estado – União, estados e municípios – em cumprir com o seu papel coloca sob os ombros da proteção – falida, mas com excelente boa vontade – uma tarefa impossível de se cumprir”, finaliza o advogado.

Daniela Sousa é responsável pela assessoria de comunicação do movimento Brasil Sem Tração Animal e Direito Animal Brasil (Dabra).

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