Fim da agropecuária interromperia aumento dos gases de efeito estufa

Foto: Andrew Skowron

De acordo com um estudo da Universidade Stanford e Universidade da Califórnia publicado recentemente na revista científica PloS Climate, o fim da agropecuária e a adoção global de uma dieta à base de vegetais interromperia o aumento dos gases de efeito estufa por 30 anos – dando tempo à humanidade para reduzir sua dependência de combustíveis fósseis.

“Queríamos responder a uma pergunta muito simples: qual seria o impacto de uma eliminação global da pecuária nos gases de efeito estufa e seu impacto no aquecimento global?” diz Patrick O. Brown, professor emérito de bioquímica da Universidade Stanford, em um release da instituição. Brown é coautor do artigo com Michael Eisen, professor de genética e desenvolvimento da UC, em Berkeley.

Eles afirmam que a eliminação gradual da pecuária em 15 anos teria o mesmo efeito de uma redução de 68% das emissões de dióxido de carbono até o ano de 2100 – fornecendo 52% das reduções líquidas de emissões necessárias para limitar o aquecimento global a 2 graus Celsius acima dos níveis pré-industriais, que os cientistas dizem ser o limite mínimo necessário para evitar mudanças climáticas desastrosas.

As mudanças resultariam, dizem os autores, em uma grande recuperação de biomassa em ecossistemas naturais. “Reduzir ou eliminar a agricultura animal deve estar no topo da lista de possíveis soluções climáticas”, defende Brown. “Espero que outros, incluindo empreendedores, cientistas e formuladores de políticas globais, reconheçam que esta é nossa melhor e mais imediata chance de reverter a trajetória das mudanças climáticas.”

Brown e Eisen não são os primeiros a apontar que as emissões contínuas da pecuária estão contribuindo para o aquecimento global. Mas o que não foi reconhecido antes, dizem eles, é a oportunidade que pode ser gerada pela grande redução de emissões negativas com a eliminação da criação de gado.

“À medida que as emissões de metano e óxido nitroso do gado diminuem, os níveis atmosféricos desses potentes gases de efeito estufa cairão drasticamente dentro de décadas”, frisa Patrick O. Brown. “E o CO2 que foi liberado na atmosfera quando as florestas e pradarias selvagens foram substituídas por culturas alimentares e pastagens podem ser convertidos novamente em biomassa à medida que a agropecuária é eliminada.”

Brown e Eisen usaram dados disponíveis publicamente sobre produção pecuária, emissões vinculadas e potencial de recuperação de biomassa em terras agropecuárias para prever como a eliminação gradual de toda ou parte da produção global da pecuária alteraria o efeito antropogênico líquido, ou causado pelo homem, a partir dos níveis de emissões de 2019. Eles usaram um modelo climático simples para projetar como essas mudanças afetariam a evolução dos níveis atmosféricos de gases de efeito estufa e o aquecimento pelo resto do século.

Os pesquisadores examinaram quatro cenários alimentares: uma substituição imediata de toda a agricultura animal por uma dieta exclusivamente vegetal; uma transição de 15 anos mais gradual e, segundo os autores, mais realista, para uma dieta global à base de vegetais; e versões em que apenas a carne bovina foi substituída por produtos vegetais.

Para cada cenário hipotético, os cientistas assumiram que as emissões não agrícolas permaneceriam constantes e que a terra anteriormente usada para a produção pecuária seria convertida em pradarias, florestas e similares que absorveriam dióxido de carbono atmosférico.

“O efeito combinado é surpreendentemente grande e – igualmente importante – rápido, com grande parte do benefício alcançado até 2050”, assinala Brown. “Se a pecuária fosse eliminada ao longo de 15 anos e todas as outras emissões de gases de efeito estufa continuassem inabaláveis, a eliminação criaria uma pausa de 30 anos nas emissões líquidas de gases de efeito estufa e compensaria quase 70% do efeito de aquecimento dessas emissões até o final do século.”

Embora o artigo não explore os detalhes do que uma eliminação global da agricultura animal implicaria, os autores apontam que é provável que um investimento global substancial seja necessário para garantir que as pessoas que atualmente vivem da agricultura animal não sofram quando ela for reduzida ou substituída. Mas, eles argumentam que “em ambos os casos, esses investimentos devem ser comparados às perturbações econômicas e humanitárias do aquecimento global”.

Brown e Eisen avaliam que muitos podem zombar da ideia de que bilhões de pessoas sendo convencidas sobre a adoção de uma dieta à base de vegetais em 15 anos. Para esses céticos, Eisen aponta que outras revoluções aconteceram em menos tempo. “Passamos de não ter celulares para celulares onipresentes em menos tempo do que isso. Eletricidade, carros, painéis solares – tudo se tornou comum em um período de tempo relativamente curto.”

Além disso, acrescentou Brown, as atitudes da sociedade em relação à alimentação estão longe de ser fixas. “Quinhentos anos atrás, ninguém na Itália tinha visto um tomate. Sessenta anos atrás, ninguém na China jamais havia bebido uma Coca-Cola. A carne de carneiro já foi a carne mais popular na América”, exemplifica. “As pessoas em todo o mundo adotam prontamente novos alimentos, especialmente se forem deliciosos, nutritivos, convenientes e acessíveis”.

Os cientistas disponibilizaram todos os dados brutos que usaram, bem como seus cálculos e o código de computador usado para realizar os cálculos, publicamente para que outros possam tomar suas próprias decisões. “A grande coisa sobre a ciência é que, no final, tudo se resume a se as conclusões são apoiadas pelas evidências”, diz Brown. “E neste caso, elas são.”

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Jornalista e especialista em jornalismo cultural, histórico e literário (MTB: 10612/PR)

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