Jo Frederiks: “Animais não são coisas, não são nossos escravos”

Jo Frederiks se tornou vegana em 1993 (Foto/Arte: Divulgação)

Jo Frederiks é uma artista australiana que cria desenhos e pinturas para conscientizar as pessoas sobre a crueldade contra os animais na indústria alimentícia, farmacêutica e de entretenimento. Durante muitos anos, ela se dedicou principalmente à vida selvagem enquanto tema, até que em 2010, sentindo-se frustrada e desiludida com a sua arte, decidiu buscar uma motivação maior.

“Pedi ao meu parceiro por um conselho, e ele disse: ‘Você é apaixonada pelo que? Imediatamente respondi: ‘Veganismo!’ Então continuei a falar seriamente sobre o holocausto animal. Ele sugeriu: ‘Pinte isso. Pinte pelo que você é apaixonada.’ Esse conselho foi fundamental e mudou completamente a direção da minha vida”, contou Jo Frederiks em entrevista ao blog Animalista Untamed em 4 de março de 2016.

A artista que se graduou na Academia de Artes de Brisbane, na Austrália, trabalha principalmente com grafite e pintura a óleo. Uma de suas grandes preocupações ao pintar seres não humanos é retratar a singular individualidade de cada um. Jo cresceu rodeada de animais, mas não de forma harmoniosa.

Ela foi criada em uma das maiores estações de gado da Austrália, com um milhão de hectares, em Queensland. Lá, seu pai possuía inúmeras propriedades, onde milhares de animais foram criados para serem mortos. “Aprendi rapidamente a me insensibilizar com a brutalidade da vida na fazenda, como todas as pessoas do interior fazem. Houve matanças implacáveis, mutilações bárbaras e torturas que são consideradas ‘prática padrão da indústria.’ Aqueles que menosprezávamos, como o gado, eram considerados meras coisas, naquela época e ainda hoje. Não havia nada remotamente humano em nada disso. Nada!”, explicou ao Animalista Untamed.

Em 1993, não aceitando mais a realidade imposta aos animais não humanos, Jo Frederiks tornou-se vegana e defensora dos direitos animais. O que a motivou foi um evento da Animal Liberation Victoria, em Melbourne. “Peter Singer era um dos palestrantes, e fui introduzida em seu divisor de águas, [o livro] ‘Animal Liberation’, que li imediatamente. Antes disso, eu estava completamente inconsciente do horror da indústria de laticínios e ovos. A melhor parte é reconhecer que não contribuo mais para o sofrimento desnecessário de seres sencientes. Já a grande dificuldade é lidar com a apatia e indiferença da sociedade em relação a isso”, declarou ao blog Animalista Untamed.

Desde 2010, Jo Frederiks é uma artista em tempo integral que direciona sua arte quase que completamente para a questão animalista. Ou seja, sua missão é mostrar por meio de desenhos e pinturas como nossa relação com os animais é imoral e antiética. Em entrevista ao Cruelty Free Festival 2016, ela deixou claro que sua mensagem é fazer com que as pessoas entendam que todos os animais devem ser respeitados.

“Usar a arte para expor a injustiça é uma forma de fazer algo construtivo sobre isso. É sobre falar a verdade. A mensagem é pungente e perigosa. A sociedade não quer ser incomodada. A mensagem [por meio da arte] é tão perigosa quanto a posição de [Abraham] Lincoln sobre a abolição da escravidão”, comparou.

Em entrevista ao Nonhuman Rights Project em 29 de julho de 2015, Jo Frederiks declarou que animais não humanos não são coisas, não são nossos escravos, e não são nossos para explorarmos ou abusarmos deles. “Suas vidas lhes pertencem. Eles merecem justiça. Têm o direito de exercer sua personalidade. No final, nosso próprio futuro é baseado em um reflexo de como tratamos nossos companheiros não humanos”, ponderou.

Para Jo, a arte tem o poder de tocar as pessoas e inspirá-las na busca por sua própria posição moral e ética em relação aos animais. “A arte atinge pessoas onde fotografias e a palavra escrita não podem. É um mecanismo para a consciência social e uma plataforma para a demonstração do que a mente pode fazer para mudar o mundo”, defendeu.

A artista  lamenta que a maioria das pessoas não querem ouvir os fatos quando se trata do sofrimento animal e destruição do meio ambiente causados pela agropecuária. “Não se dispõem a olhar para as fotos ou confrontar vídeos de vítimas indefesas reduzidas à comida. Apesar disso, eles vão olhar para uma pintura ou um esboço. É uma poderosa e efetiva forma de penetrar nessa negação profundamente enraizada, nessas mentiras e doutrinação em que todos nascemos. Espero que minha arte inspire mudança”, disse ao Animalista Untamed em 4 de março de 2016, acrescentando que a transformação depende da educação e da percepção.

Para Jo Frederiks, criar arte vegana é como esculpir uma estátua de mármore com uma pena. “É um trabalho longo e tedioso, mas tem que ser feito se quisermos salvar o planeta e nossa espécie para as gerações futuras”, assinalou.

Em uma de suas obras mais populares, “We Didn’t Even Make It This Far”, Jo Frederiks registrou a moagem de pintinhos machos, indesejados pela indústria, já que não botam ovos. A pintura que remete à pop art, é uma estratégia da autora para prender a atenção do espectador e fazer com que ele reflita sobre as reais consequências dos chamados ovos livres de crueldade, o que segundo ela não passa de enganação da indústria alimentícia, já que não existe produção de ovos sem submeter a galinha a uma vida de exploração, privação ou sofrimento. Em síntese, ao comprarmos ovos, financiamos a morte de “bebês indefesos”, como Frederiks se refere aos pintinhos.

Canalizando com singularidade a sua relação com os animais e projetando isso em forma de desenhos e pinturas, a artista australiana demonstra facilidade em transmitir uma resposta visualmente rica e informativa sobre tudo que testemunha em relação ao tratamento que damos aos animais não humanos. O realismo cru da matança de seres sencientes é transmitido por ela de forma pungente, mas que estimula reais possibilidades de reflexão e sensibilização por parte do espectador que não é vegano nem vegetariano.

Jo Frederiks também faz críticas pontuais à exploração praticada por corporações multinacionais, como por exemplo, na obra “Palm Oil and Pollution”, em que critica o uso insustentável e indiscriminado do óleo de palma, prática que tem destruído o habitat de animais como orangotangos. A triste e cruel realidade da exportação de animais vivos, que muitas vezes morrem durante viagens longas e excruciantes, foi materializada na obra “Indefensible – Live Animal Export”, além de outros desenhos e pinturas.

Mais uma de suas obras famosas é “Lady Justice”, em que a Senhora Justiça aparece enforcada ao lado de animais abatidos, transmitindo a ideia de que a justiça também é sacrificada sempre que um animal é morto desnecessariamente para o benefício humano. Em “Kill To Dress”, que critica a alta costura, uma mulher está usando um vestido que custou a vida de um sem número de pequenos animais indefesos.

Não menos impactante é “Vivisection: R.I.P. Double Trouble”, que homenageia um gato submetido a cirurgias desnecessárias em seus ouvidos, crânio e cérebro, procedimentos realizados sem anestesia, na Universidade de Wisconsin-Madison, nos Estados Unidos, revelando a crueldade envolvida na vivissecção.

Em junho de 2013, ativistas pelos direitos animais em Israel resgataram um bezerro que trazia no corpo o número 269. Por causa disso, se apresentaram mais tarde como Movimento 269, o que motivou ativistas de todo o mundo a se identificarem como 269. O episódio inspirou Jo Frederiks a criar a obra “We Are All 269” em referência ao resgate.

Saiba Mais

Aos 13 anos, Jo Frederiks testemunhou o terror de um boi durante o abate. Ele foi estraçalhado por um homem empunhando um machado. O sujeito tinha um revólver preso à cintura, mas preferiu usar o machado para terminar o trabalho, isto porque ele queria economizar o custo de uma bala.

Referências

http://jofrederiks.altervista.org/biography.php

https://animalistauntamed.com/2016/03/04/jo-frederiks-artist-for-the-animals/

http://www.nonhumanrightsproject.org/2015/07/29/featured-volunteer-jo-frederiks/

http://www.sparklingadventures.com/index.php?id=2006





Jornalista e especialista em jornalismo cultural, histórico e literário (MTB: 10612/PR)

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