Quem se importa com o sofrimento dos frangos?

A cada minuto que dedico a este texto, são mortas mais de 11,9 mil dessas aves (Foto: Andrew Skowron)

No Brasil, há sempre mais frangos sendo transportados para os matadouros do que bovinos e suínos. Em relação a suínos, o número de frangos mortos por ano é 116 vezes maior; em relação a bovinos, é 224 vezes maior.

Frangos morrem mais porque são animais pequenos, mortos com não mais de 45 dias e peso médio de três quilos. A maior vítima do sistema alimentar brasileiro é o frango – mais ainda em tempo de crise financeira, porque sua miséria também intensifica-se com as dificuldades econômicas, elevando a demanda por sua carne, que também é por sua morte.

A cada minuto que dedico a este texto, são mortas mais de 11,9 mil dessas aves. Também é tempo suficiente para o desaparecimento de frangos de mais de três grandes caminhões, considerando os que transportam, em média, 3,3 mil aves. Claro, “desaparecimento” como eufemismo para degola, sangria e fim.

Quando vejo essas aves penduradas de ponta-cabeça, e a mecanicidade/velocidade com que são mortas, penso em como nosso sistema trivializou o ato de matar por meio de sua institucionalização, mutável aos interesses hegemônicos.

É como se pendurassem “algo indefinível”, “uma coisa que deve sangrar”, e destituída de associação com uma ideia de ser e pertencer. Há um tempo, célere, que não reconhecemos, e esse tempo, o que representa para quem já deixa de ser?

A velocidade que aponto também como visceralidade da banalização, por exercício de repetição que nunca chega ao fim, pode ser o oposto para quem não sou, que não compartilha dessa percepção de tempo, e que pendurado está para ser degolado.

Toda plataforma industrial de abate de frangos remete à continuidade. Observe a posição dos corpos fragilizados das aves, em suas imobilidades ou subtrações parciais até tornarem-se totais. Morrem simultaneamente, com pouca distância entre elas.

A matança de frangos é simbólica do “aperfeiçoamento” de uma arbitrariedade institucionalizada, porque ocorre em um espaço industrial, de legitimidade legal pouco depreciada, em que o número mais elevado de vidas deixa de ser, como se nunca fosse, pela primazia do lucro/consumo.

Jornalista e especialista em jornalismo cultural, histórico e literário (MTB: 10612/PR)

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