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Por que repudiar uma violência contra um animal e não o assassinato do animal?

Há pessoas que repudiam amarrar um porco pelo focinho, mas não uma faca no pescoço do porco

Um porco foi amarrado pelo focinho e transportado em uma caminhonete. A justificativa de quem fez isso foi de que o “trajeto seria curto”. O porco morreu pouco depois de ser resgatado pela Polícia Ambiental. A imagem da situação do porco também gerou repúdio em consumidores de carne.

“É inadmissível tratar um animal assim”, “Que crueldade!” e “Isso é maldade!” são alguns exemplos de comentários. Para a maioria, o problema não está em enviar o animal para o matadouro, não está na privação da vida e de interesses, e sim em uma estranha moral em que o errado não está no que antagoniza o interesse do porco, mas no que antagoniza o interesse humano em relação aos limites aceitáveis de violência e crueldade.

É como dizer que podemos ser destrutivos em relação a outros animais, mas essa destruição precisa ser mediada para parecer menos destrutiva do que é, menos privativa do que é, menos violenta do que é, ainda que para o porco a experiência seja terrivelmente irreversível.

É errado fazer isso (menos recorrente) com o porco. Mas não é errado fazer aquilo (normalizado) com o porco. E mesmo que os dois exemplos sejam reprováveis, o “isso” tira menos a vida do que o “aquilo”, e o “aquilo” justifica o “isso”. Que defesa é essa em que é reprovável um mal, mas não outro e que é o mal recorrente que culmina no mal considerado menos recorrente e portanto mais comumente intolerável?

Quem resgata um porco, se come porco, também contribui para que o porco precise ser resgatado. E isso vale em relação a outros animais. Porque não é necessário pensar especificamente em um animal, mas sim na condição, por comum, imposta ao animal.

A reprovação de determinadas violências e não de outras em relação a esses animais é como dizer que sempre podemos feri-los e matá-los, que não há problema nisso, desde que esteja em conformidade com a moralidade dominante.

Há pessoas que repudiam amarrar o focinho de um porco, um chute em um porco, mas não uma faca no pescoço do mesmo animal. Então dirão que a segunda ação é aceitável porque corresponde a um interesse humano predominante enquanto a primeira não, porque é violência desnecessária. Mas a segunda também não é?

Leia também “Quando testemunhei um homem pelando um porco“, “Um humano na pele de um porco“, “O homem que salvou o porco que ele deveria matar“, “Um porco escapa do abate e volta pelos outros” e “O mau cheiro vem do porco ou da exploração do porco?

Jornalista (MTB: 10612/PR) e mestre em Estudos Culturais (UFMS).

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