Valdir Colatto no comando do Serviço Florestal representa mais riscos para os animais silvestres e para a Amazônia

Até o ano passado, Valdir Colatto também se esforçou para tornar o Código Florestal “menos restritivo” (Fotos: Reprodução)

O ex-deputado federal e agropecuarista Valdir Colatto (MDB-SC) vai assumir a chefia do Serviço Florestal Brasileiro após nomeação da ministra da agricultura Tereza Cristina (DEM-MS). Colatto, que no ano passado foi convidado pelo presidente Jair Messias Bolsonaro (PSL) para trocar de partido, era um dos mais combativos membros da Frente Parlamentar Agropecuária (FPA) – afamado por colocar os interesses dos grandes ruralistas acima do meio ambiente.

Em 2016, Valdir Colatto apresentou o projeto de lei nº 6.268, que dispõe sobre a política nacional de fauna. Em síntese, o projeto, que foi rejeitado pelo relator e presidente da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CMADS), deputado federal Nilto Tatto (PT-SP), insistia no relaxamento das leis ambientais brasileiras.

A tentativa de flexibilização representaria um claro retrocesso considerando que previa a alteração no Código de Caça brasileiro, editado em 1967, proibindo a caça em todo o território nacional por entender que a realidade brasileira não perpassa pela necessidade de caça de animais silvestres. Porém, Colatto alegou que hoje em dia a proximidade de animais silvestres com o meio rural coloca em risco pessoas, propriedades e rebanhos, o que na sua perspectiva justifica a liberação da caça.

Embora Valdir Colatto não seja mais deputado federal, no ano passado, durante a sua campanha, o presidente Jair Messias Bolsonaro sinalizou a favor do seu projeto de legalização da caça. O posicionamento favorável foi confirmado em encontro com membros da Associação Nacional de Caça e Conservação (ANCC), sediada em Goiânia. Caso o presidente Bolsonaro leve adiante a defesa da caça, talvez seja válido perguntar: “Como os animais silvestres podem ser vistos como uma ameaça que já não representavam em 1967?” Principalmente se considerarmos que da década de 1960 até a atualidade houve uma redução, não um aumento da fauna brasileira em decorrência do desmatamento.

Outro fato a se ponderar é que animais silvestres, apontados antes por Valdir Colatto como ameaças, normalmente só invadem propriedades por dois fatores – perda de habitat e fome, e tanto a perda de habitat quanto a fome estão associadas à perda de vegetação, ou seja, desflorestamento. Afinal, nenhum animal deixa a natureza selvagem por espontânea vontade. Logo se os animais silvestres se tornam uma ameaça, isso acontece simplesmente em decorrência da má intervenção humana visando a lucratividade.

Não é nenhuma novidade que o lucro sempre foi uma prioridade para o novo chefe do Serviço Florestal Brasileiro. Vale lembrar que Colatto se empenhou em prorrogar o prazo de inscrição dos ruralistas no Cadastro Ambiental Rural (CAR) e quis impedir que os dados dos proprietários rurais cadastrados fossem divulgados. Essa falta de transparência levanta suspeitas sobre o favorecimento do desmatamento, já que o CAR existe exatamente para fiscalizar e monitorar as ações dos proprietários rurais e impedir que eles prejudiquem a Amazônia, habitat de mais de dois milhões de espécies animais. Sendo assim, por que alguém não iria contribuir com o CAR se está atuando dentro da lei?

Até o ano passado, Valdir Colatto também se esforçou para tornar o Código Florestal “menos restritivo”, o que beneficiaria ele e seus colegas da Frente Parlamentar Agropecuária (FPA) que estão de olho na Amazônia. Honestamente, é difícil crer que alguém que não vê grandes problemas no desmatamento esteja realmente preocupado com as nossas florestas e tenha todos os predicados necessários para comandar um órgão tão importante como o Serviço Florestal Brasileiro. Não reconhecer a dimensão do impacto do desflorestamento é rejeitar a realidade. E colocar os interesses econômicos acima disso é trilhar um caminho sem volta. Documentários lançados recentemente como “A Pata do Boi”, de Marcio Isensee e Sá, e o curta “Eu Sou Mudança – Consumo Consciente”, do Google, revelam como a Amazônia tem sido castigada pela transformação de grandes áreas desmatadas em pasto – o equivalente a países como França e Espanha.

Outro agravante é que já temos 50 animais em risco de extinção na floresta amazônica. Então nomear como chefe do Serviço Florestal Brasileiro alguém que inclusive simpatiza com a caça, realmente não ajuda a fauna e a flora brasileira. Talvez seja válida uma reflexão compartilhada pelo professor de história israelense Yuval Noah Harari, autor do best-seller “Sapiens: Uma Breve História da Humanidade”, lançado oficialmente em 2014:

“A marcha do progresso humano está repleta de animais mortos. Há dezenas de milhares de anos, nossos antepassados da idade da pedra já eram responsáveis por uma série de desastres ecológicos. Quando os primeiros humanos chegaram à Austrália há cerca de 45 mil anos, eles rapidamente promoveram a extinção de 90% dos grandes animais. Esse foi o primeiro impacto significativo que o Homo sapiens teve no ecossistema do planeta. E não foi o último. Cerca de 15 mil anos atrás os humanos colonizaram a América, eliminando cerca de 75% dos mamíferos. Numerosas outras espécies desapareceram da África, da Eurásia e das miríades de ilhas ao redor de suas costas.”

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Segundo a Agência Ansa, em um período de 65 anos, cerca de 23 milhões de mamíferos e répteis selvagens de mais de 20 espécies foram mortos por caçadores na Amazônia.

Jornalista e especialista em jornalismo cultural, histórico e literário (MTB: 10612/PR)

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