Vida curta para o porco, vida longa para o cão

Ilustração: Shan Crosbie

Cachorro e porco, olho de um no olho do outro. Qual tem ausência de emoção, de sentimento, de coração? Nenhum, mas como se fosse um.

Há uma barreira, ensaio de liberdade e de dominação. Um pode brincar e o outro não. Por que não? Não é permitido brincar com a comida.

Escurece e continuam ali. Só olhos, mais nada. E se vagassem numa prescindibilidade do corpo? O que as testemunhas reconheceriam?

Identificariam expressividade nos olhos e observariam com menos preconceito ou pré-conceito? Se acontecesse, seria por fácil identificação?

Pode supor que não, por tentativa de impercepção que leva a uma distorção que vem duma cultura de aceitação. Ó, humano? Parece? Sim, mas não é intenção.

Não? E se for? Que seja então para consideração. Cachorro e porco estão no mesmo lugar, que não é o mesmo. Há distância, que não é deles, é humana.

Definições do ser são coisas estranhas, que oscilam por atribuições de valor. O que é um valor neste caso? Uma medida ou mensura de benefício, sacrifício? O primeiro para uns e o segundo para outros.

Cachorro quer brincar com o porco. Há recíproca? Por que não haveria? O que predomina é a vontade de quem não quer – e não é um nem outro. Não nasceu para isso. Sim, para o suplício.

Cão viu quantas substituições, chegadas e partidas? Já correu atrás do caminhão muitas vezes, até que acostumou. Será que lembra dos que já foram e nunca voltaram?

Quem sabe? Continua olhando para os que estão ali, e eles olham para ele. Cachorro é o mesmo há nove anos, e os porcos não são os mesmos há 17 rebanhos.

Há uma troca, doutro tipo e que não posso definir, mas permito-me uma questão formada por conclusão.

Quantos porcos desejaram ausência de barreira? Mais um caminhão vai embora, levando porcos que veem o cachorro correndo lá fora. Outro adeus que tem fim sem ter.

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Jornalista e especialista em jornalismo cultural, histórico e literário (MTB: 10612/PR)

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