Quando terá fim a cruel “farra do boi”?

Na “farra do boi”, o animal é provocado, perseguido e violentado até não ter mais forças para se levantar (Fotos: Reprodução/PMSC)

Proibida no Brasil há mais de 20 anos, a “farra do boi” continua a ser realizada ilegalmente em Santa Catarina, onde a prática quase sempre termina com a morte do animal, seja em decorrência da violência da “farra” ou da execução após a captura. O abate é realizado pela Companhia Integrada de Desenvolvimento Agrícola de Santa Catarina (Cidasc).

O movimento Brasil Contra Farra (BCF) já denunciou muitas vezes que em diversas comunidades de Santa Catarina eles são submetidos à violência apenas por “diversão”. Embora a “farra do boi” se intensifique mais na época da Quaresma, também é realizada antes e depois do Natal; ou mesmo fora de época, quando o boi se torna vítima de algum tipo de celebração, que pode ser até mesmo um aniversário ou um casamento.

Quando o animal é provocado e agredido é natural que fique agressivo. Mesmo após a captura, quando ele já não apresenta qualquer risco o abate infelizmente é o seu destino,  sob alegação do animal não trazer identificação e ser um risco para outros bovinos, ainda que a vítima seja saudável. Os “farristas” fazem questão de tirar o brinco do boi para que seja difícil localizar o ex-proprietário do animal.

Solto e perseguido por “diversão”

Na “farra do boi”, o “escolhido” é doado ou comprado por um grupo e solto e perseguido por pessoas das mais diferentes faixas etárias. Acredita-se que há casos de doações de bois por parte de políticos. Quem não conhece a “farra do boi” pode achar que os “farristas” apenas correm atrás do animal e fogem dele. Mas a realidade é bem diferente, já que a crueldade é evidente.

Os bois tentam encontrar abrigo durante a perseguição, e nessas situações danos materiais podem ser inevitáveis – e claro que como consequência da provocação e da violência humana. Na tentativa de escapar dos “farristas”, há casos de animais que correm em direção ao mar e acabam morrendo afogados.

Os participantes costumam dizer que a “brincadeira” tem um viés religioso, já que a “farra do boi” é encarada como a “perseguição de Judas, o traidor de Cristo” – uma “herança cultural” herdada de seus ancestrais católicos, alegam.

No entanto, além da Igreja Católica não aprovar a prática, organizações que atuam em defesa dos animais, como o Brasil Contra Farra (BCF) sempre frisam que é apenas violência pela violência, já que não há a mesma preocupação em relação a outros elementos inofensivos da cultura açoriana como “O Boi de Mamão” e o “Pão-por-Deus”.

Governador Celso Ramos, reduto da Farra do Boi

Já houve casos em que os “farristas” jogaram pimenta nos olhos dos animais, segundo informações do Projeto Esperança Animal (PEA).

A Polícia Militar de Santa Catarina continua registrando práticas de “farra do boi”, embora em menor proporção do que em 2019, e a pequena Governador Celso Ramos ainda é o “maior reduto de farra do boi” do Brasil. Há episódios em que um animal foi perseguido por dois ou até três dias até ceder sem forças e morrer. Ao final, os participantes o retalharam e dividiram a carne.

A “farra do boi” foi proibida no Brasil pelo Supremo Tribunal Federal (STF), quando os ministros a qualificaram como “intrinsecamente cruel”. Portanto, quem for detido participando da prática pode ser condenado a um ano de prisão, conforme a Lei de Crimes Ambientais (9.605/1998).

O Estado de Santa Catarina também proíbe a “farra”, inclusive com multa de até R$ 10 mil desde janeiro deste ano, conforme a lei 17.902/2020. Ainda assim, a prática parece distante de ser definitivamente abolida, já que a impunidade é favorecida pelas más condições de fiscalização.

Artigo atualizado em 2 de agosto de 2020. 

Jornalista e especialista em jornalismo cultural, histórico e literário (MTB: 10612/PR)

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