“As galinhas vão para o céu?”

Uma breve reflexão sobre a exploração e consumo de animais a partir da série “Jovem Sheldon”

 

O episódio 11 da terceira temporada da série “Jovem Sheldon”, de Chuck Lorre e Steven Molaro, serve para uma reflexão sobre a exploração e consumo de animais. “Pastor Jeff, as galinhas vão para o céu?, pergunta Billy. “A Bíblia não diz muito sobre a alma dos animais, mas prefiro acreditar que Deus ama toda as suas criaturas. Por quê?” “Porque meu pai quer comer a Matilda.”

Brenda, a mãe de Billy, argumenta: “Não é ruim como parece. Ela parou de botar ovos. Então vai perder a cabeça e ir para a panela.” Mesmo que houvesse uma predominante crença de um céu para os animais, isso poderia ser usado para justificar o fim dos animais pela primazia do paladar?

Isso evoca um ponto levantado pelo teólogo Humphry Primatt que, no século 18, declarou que a crença de que os animais não têm alma, como defendida por Descartes, se tomada como verdade, não deveria ter efeito oposto à intenção de seus proponentes? Se na ausência de alma, assume-se que não há outra vida para eles a não ser a única deste mundo.

Quanto ao fim da galinha, o dizer “não é ruim como parece” leva à conclusão de que “não produzir” justifica o matar. É como se matá-la só pudesse ser “ruim” se ela ainda fosse capaz de gerar ovos. Logo o “ruim” não é pela perspectiva do que é o fim para o animal, mas da não oportunidade de obter ovos de quem “poderia produzir”. O “não é ruim” é evidência da percepção de “não desperdício”, de “não prejuízo”.

Ou seja, o animal vive ou morre com base no que é avaliado como gerável em vida ou em morte. Na ausência do “potencial primeiro” fica-se com o “potencial segundo”. Assim a panela é o lugar do animal que “não mais produz”. O episódio da série apenas reproduz a cotidianidade sobre os animais instrumentalizados e produtificados, também em ambiente doméstico.

Missy, irmã de Sheldon, tenta evitar a morte da galinha, a escondendo. Também foge com o balde com frango que seu pai está comendo. Ela tem uma reação que não limita-se a Matilda, porque o que está no balde não é Maltida, mas análogo a Matilda.

Porém a percepção de Missy é episódica, assim como de muitas crianças que testemunham algo que as marcam, mas mais tarde já não pensam a respeito pela influência do meio.

Jornalista e especialista em jornalismo cultural, histórico e literário (MTB: 10612/PR)

Uma resposta

  1. Tem razão qto ao fato de que as crianças serão capturadas pela cultura carnívora. Semelhante objetificação acontece no olhar e atitudes dos nazistas sobre os judeus e dos judeus sionistas e assemelhado sobre os palestinos.

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