Quando leio uma matéria sobre bois deixados intencionalmente em estado de desnutrição em uma propriedade rural, como ocorreu recentemente em Coxim (MS), e essas notícias são mais frequentes do que as pessoas imaginam, me pergunto qual é a percepção que a maioria dos leitores têm sobre essa realidade.
As pessoas tendem a se sensibilizar, mesmo quando consomem carne e outros produtos de origem animal. Reparam nos ossos destacados, que parecem próximos de rasgar a pele de seus corpos fragilizados. Ficam incomodadas com a dificuldade de mobilidade desses animais, com suas expressões de definhamento.
Mas é importante ir além de uma consideração pontual. É preciso pensar sobre o lugar em que esses animais estão e para qual finalidade. O que culmina nisso? Será mesmo que isso deve ser pensado somente como uma maldade praticada por um humano? Que não há nada por trás disso a ser refletido?
O que permite ao pecuarista achar que é aceitável fazer isso com esses animais é que para ele “são apenas animais”, “seus animais”, e que podem ser deixados para morrer, caso ele julgue que não vale a pena mantê-los vivos para matá-los em outro momento que concluir ser o mais adequado.
O que o leva a agir assim é a relação que ele estabelece com eles por meio de um arbitrário estado de propriedade, porque sendo o animal reduzido a um bem, um meio de obtenção de algo por imposição, e que deve sofrer um mal baseado no interesse humano, esses animais já estão em desvantagem sobre o valor de suas vidas, que não é visto como inerente em si.
É necessário refletir sobre essa realidade com base na imposição de propriedade sobre esses animais, uma imposição que na pecuária só sustenta-se pelo interesse de consumo, porque um animal criado para fins de consumo está mais próximo de ser pensado como um animal que pode ser descartado ou deixado para morrer.
É um equívoco olhar para essa realidade e não considerar sua relação com o próprio sistema em que animais instrumentalizados e produtificados estão inseridos, porque são vidas que têm sua desconsideração baseada na conclusão de que é mais econômico deixar morrer.
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