
Do que é feita a infância dos animais criados para consumo? É o que pergunto enquanto observo um leitãozinho recém-nascido perto do corpo da mãe. Ele parece tranquilo quanto à experiência de nascer. Sente-se protegido. Não o incomoda ter pedaços de palha na cabeça e outros vestígios.
Seu olhar transita da mãe para um pequeno espaço, e assim vai e volta. Explora o mínimo que pode explorar, que, pela limitação, é também um não explorar. Sua vida não é definida por ele nem por sua relação parental.
Em menos de duas semanas, dentes e rabo cortados, castração. Nenhuma anestesia. Conhece a dor de viver para não viver. Guincha, geme, treme, debate-se. E o que um corpo pequeno e não humano pode fazer?
A infância é uma não infância? Não verá mais a mãe. A idade é uma não idade, um tempo avaliado no inverso, que não é sobre a experiência de viver – é sobre quanto falta para morrer. Dele esperam bacon, bisteca, pernil, costelinha, pancetta, lombo, carré, paleta – e presunto.
Imagino alguém dizendo ao leitãozinho que deve crescer o mais rápido possível para que seja vendido e comido. Ele com palha ainda na cabeça, e olhando para a mãe sem saber que sua vida não é sobre sua vida.