“Produção animal” é obrigar um animal a produzir o próprio fim

Foto: Unparalleled Suffering

O que é a “produção animal” senão um eufemismo para males impostos por interesses econômicos e de consumo?

A ideia de produção animal pode levar a uma conclusão romanesca de que animais não são subjugados, mas apenas têm seus potenciais explorados de forma satisfatória, como se produzir fosse a vocação não humana – ainda que o produto, de base gradual e/ou letal, seja o “esvaziamento” de sua condição viva.

Produção animal como conceito transfere acepção paradoxal de naturalidade a capacidades inaptas, porque nenhum animal que compõe o contexto de produção animal é o que é por sê-lo, mas por não sê-lo, pelas imperiosas manipulações de suas condições incompatíveis com a realidade produtiva se desconectada de uma realidade não dominativa.

Experimente comparar realidades “naturais” ou não domésticas e domésticas ou “aperfeiçoadas” (em relação ao que chamam de produção) – que é outro eufemismo para violações biológicas. O termo produção animal atribui aos animais uma determinação/obrigatoriedade funcional que torna indissociável a concepção de produção e animal.

Sua dissociação é encarada como impossibilidade a partir da crença de que o animal só existe e só deve existir para produzir – que sem produzir tem-se uma criatura de não valor, e não somente econômico ou consumerista, mas como se esvaziado em ser por si mesmo e não pelo processo dominativo.

E, por antinomia, quando não produz, sua “desanimalização” é mais rapidamente consumada, porque antagoniza a crença de que um animal não é um produto ou meio para tal, ainda que antes não tivesse sido reconhecido como animal.

A ideia de produção animal é sempre inferiorizante, indutiva de desvalores e capciosa, e superficializa impactos condicionados/não condicionados, porque embora o sistema que determina seu sentido tenha controle sobre alguns, jamais terá sobre outros.

Ademais, o que pode ser mais quimérico e insidioso do que atribuir a um animal um conceito de produção que tem seu fim como conclusão? Logo posso interpretar “produção animal” como um animal obrigado a produzir seu próprio fim.

Jornalista e especialista em jornalismo cultural, histórico e literário (MTB: 10612/PR)

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