É mais barato ser vegano

O que sai caro é superestimar o consumo de alimentos de origem animal

Quando se fala em ser vegano, normalmente a principal preocupação das pessoas é sobre a alimentação, o custo de ter uma alimentação sem nada de origem animal. Para pensar essa questão, sugiro pensarmos outra.

Hoje há muitos apontamentos sobre o alto custo das proteínas de origem animal, e não somente da carne – tanto que esse é um ponto tão utilizado hoje para reforçar antagonismos políticos e uma disputa sobre o que torna esses produtos caros ou mais caros.

Independentemente do viés, o que o reconhecimento dos produtos de origem animal como caros evidencia (o que nunca foi novidade para quem é vegano), é que é mais barato ser vegano do que não ser.

Quero dizer, todas essas polêmicas que existem hoje sobre o preço dos alimentos de origem animal, como carnes, laticínios, ovos, etc, mostram que se ter uma alimentação rica em alimentos de origem animal é caro, como afirmar que não tê-la é que é caro?

Quem é vegano sabe que é possível ter uma alimentação mais diversificada, prazerosa e saudável sem os altos gastos dos consumidores que mantêm uma relação de dependência com as proteínas de origem animal.

Recentemente uma pesquisa da Kantar Brasil, publicada também em seu site, revelou que importante parte do orçamento dos brasileiros destinado à alimentação é gasto com proteínas de origem animal, ficando a carne em primeiro lugar.

Isso leva à negligência do importante consumo de vegetais, já que se superestima as carnes e, por outro lado, se subestima a importância dos vegetais.

Há uma percepção de essencial em relação ao primeiro e não ao segundo que tende a ser percebido como se fosse um mero “complemento”, tão reforçado quando se fala em “salada”; algo que faz parecer que não pode ser outra coisa que não um “opcional”.

Isso é equivocado e contraditório. Afinal, há cada vez mais evidências de que ter mais qualidade de vida e mais saúde depende de uma alimentação em que vegetais são uma prioridade. Portanto desconsiderar isso seria um erro.

E claro, se há tantos consumidores afirmando hoje que carne e outras proteínas de origem animal custam caro e há um reconhecimento comum disso, então como sustentar a afirmação de que ser vegano é que é caro? E com as críticas mirando especialmente a alimentação. Na verdade, todos os argumentos contra uma alimentação sem alimentos de origem animal não podem mais sustentar esse tipo de afirmação capciosa.

Leguminosas (soja, feijões, ervilha, grão-de-bico, lentilha, etc), que são os vegetais consumidos por veganos como fontes de proteínas, e podem ser usadas de forma bastante diversificada, têm um custo que nem de longe se aproxima dos custos das proteínas de origem animal, que ficam com importante parte do orçamento familiar destinado à alimentação.

O problema é que a importância que as pessoas atribuem aos alimentos de origem animal e aos alimentos de origem vegetal faz com que estabeleçam diferentes medidas para avaliar o que deve ser gasto com cada um.

Tem-se uma ideia de que o máximo para os produtos de origem vegetal sequer pode se aproximar do mínimo para os produtos de origem animal. Vegetais que são essenciais a uma boa saúde são tratados como se não tivessem a importância que têm, havendo nisso uma prejudicial e tão normalizada inversão.

Posso usar também como referência, para exemplificar o absurdo da realidade, pessoas que afirmam que têm um orçamento bem limitado para gastos com alimentação (geralmente nessa consideração os vegetais não são vistos como prioridade), mas que destinam, por exemplo, um orçamento mensal para o consumo social de cerveja que é superior ao destinado à aquisição geral mensal de vegetais, e sendo, claro, os vegetais tão importantes à manutenção da saúde.

Acredito que os conflitos envolvendo o preço da carne e de outros produtos de origem animal deveriam motivar também uma outra reflexão, já que o custo desses produtos não está somente no custo de compra, com base no poder aquisitivo, mas também no custo para os animais (que justifica o veganismo), no custo ambiental e de saúde. Afinal, são as proteínas de origem animal que se destacam em impacto ambiental, como por exemplo, o decorrente da agropecuária – o que também afeta nossa qualidade de vida e saúde.

Continuar superestimando as proteínas de origem animal, deixando vegetais em segundo plano ou sequer em segundo plano, não tem funcionado, e porque não condiz nem mesmo com o que é melhor para nós.

Devemos nos questionar se mesmo que as proteínas de origem animal fossem extremamente baratas, o que favoreceria um consumo ainda mais alto, seria correto afirmar que o custo é baixo, se considerarmos não apenas o custo para o nosso bolso, mas também os outros custos já citados – para os animais, meio ambiente e saúde.

Não vejo como não concluir que é mais barato ser vegano do que não ser.

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Jornalista (MTB: 10612/PR) e mestre em Estudos Culturais (UFMS).

Uma resposta

  1. A questão que se coloca também, David, é em relação aos produtos veganos industrializados, na gôndolas dos supermercados, que, se comparados aos produtos de origem animal, são rotulados de caros e elitistas. Por isso criou-se essa imagem de que ser vegano é coisa pra gente rica e abastada, que tem melhores condições financeiras.
    Um exemplo clássico éo do leite vegetal: quando me veem bebendo um leite de castanha, me perguntam quanto foi. Eu digo e imediatamente a pessoa responde que “ah, mas o leite de vaca é bem mais em conta”.
    Para além da crueldade da indústria de laticínios que a pessoa desconhece/ignora, o que ela ignora também é que por causa dos lobbys de pecuaristas e de ruralistas, e com o apoio e o incentivo fiscal dos governos, a caixa de leite animal, no fim, acaba saindo mais barato que o leite vegetal/vegano, “taxado” negativamente em vários sentidos.
    Enquanto a maioria das pessoas buscarem apenas pela vantagem pessoal e pelo barateamento dos custos na administração da economia doméstica, com o incentivo do governo e da mídia, infelizmente a gastronomia vegana será considerada elitista e inacessível ao povo, e instrumentalizada sob um discurso de ódio pelos que lucram e faturam em cima do sofrimento animal, em toda a cadeia produtiva e comercial que se possa imaginar, de uma ponta a outra.

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